As Ilusões das Multidões e o Totalitarismo Moderno
As
massas nunca tiveram verdadeira sede pela verdade. Elas tendem a se afastar de
evidências que desafiam suas preferências, abraçando erros que as seduzem. Quem
oferece ilusões torna-se facilmente seu mestre; quem tenta desmantelá-las,
frequentemente, acaba sendo sua vítima.
Essa
observação, atribuída ao psicólogo social francês Gustave Le Bon, permanece
assustadoramente atual. Em seu livro A Multidão: Um Estudo da Mente Popular
(1895), Le Bon mergulha nas dinâmicas das multidões, revelando como, em grupo,
os indivíduos abrem mão da deliberação consciente, cedendo a impulsos coletivos
irracionais.
Ele
descreve as multidões como suscetíveis a manipulações emocionais, guiadas mais
por sentimentos do que pela razão. Seguindo essa linha, o psicanalista Carl
Jung alertou:
“Não
são a fome, os terremotos, os micróbios ou o câncer, mas o próprio homem que
representa o maior perigo para si mesmo, pela simples razão de que não há
proteção eficaz contra epidemias psíquicas, que são infinitamente mais
devastadoras do que as piores catástrofes naturais.”
Hoje,
vivemos um cenário em que essas “epidemias psíquicas” encontram terreno fértil.
O que diferencia o totalitarismo moderno dos regimes totalitários do passado?
A
resposta está em uma única palavra: tecnologia. Nunca antes os meios de
manipular o pensamento e incitar o medo foram tão sofisticados e onipresentes.
Televisão, internet, smartphones e redes sociais tornaram-se as principais
fontes de informação, mas também ferramentas poderosas de controle.
Durante
a recente pandemia, por exemplo, vimos como narrativas cuidadosamente
construídas por jornalistas, políticos e influenciadores digitais muitas vezes
superaram a voz de médicos e cientistas.
A
manipulação da informação em questões de saúde pública amplificou o medo e a
desinformação, enquanto algoritmos decidiam o que chegava aos olhos e ouvidos
do público.
Esses
algoritmos, projetados para maximizar engajamento, filtram conteúdos com base
em preferências prévias, criando câmaras de eco que reforçam crenças e eliminam
vozes dissonantes.
Como
resultado, a razão e o pensamento crítico são frequentemente substituídos por
narrativas de pânico ou polarização. O psicanalista Joost A.M. Meerloo, em seu
livro The Rape of the Mind (1956), foi categórico:
“Quem
controla as palavras e frases que usamos, quem domina a imprensa, o rádio - e,
hoje, a internet - domina a mente.” Ele descreve como a sobrecarga de
estímulos, sem espaço para reflexão ou diálogo genuíno, torna as pessoas mais
suscetíveis a manipulações.
A tela
do smartphone, com suas respostas prontas e narrativas simplistas, substitui o
questionamento profundo, enquanto a confusão gerada por esse bombardeio
informacional aumenta a vulnerabilidade a ilusões totalitárias.
Os
acontecimentos recentes reforçam essa ideia. Durante a pandemia de COVID-19,
por exemplo, vimos como governos e plataformas de mídia controlaram narrativas
sobre vacinas, lockdowns e tratamentos, muitas vezes censurando debates
legítimos.
Em
2023, relatórios revelaram que grandes empresas de tecnologia colaboraram com
governos para suprimir conteúdos que questionavam políticas oficiais, sob o
pretexto de combater “desinformação”.
Essa
prática, conhecida como banimento de sombra ou censura velada, limitou o acesso
a perspectivas alternativas, mesmo quando provenientes de cientistas renomados.
Além
disso, eventos como protestos contra medidas restritivas em diversos países -
como os caminhoneiros no Canadá em 2022 ou manifestações na Europa - foram
frequentemente retratados de forma distorcida, com manifestantes sendo
rotulados como extremistas, enquanto suas motivações eram silenciadas.
O
totalitarismo moderno não precisa de campos de concentração ou violência
explícita para se impor; ele opera de forma sutil, moldando percepções por meio
de algoritmos, censura e narrativas repetitivas.
A
inteligência artificial, que deveria ser uma ferramenta de emancipação, é usada
para reforçar vieses, filtrando informações e limitando o horizonte
intelectual.
Quanto
mais “lixo” informacional você consome - sejam notícias sensacionalistas,
conteúdos polarizados ou entretenimento vazio -, mais os algoritmos te oferecerão
o mesmo, aprisionando você em uma bolha de desinformação. Diante disso, a
resistência está na vigilância pessoal.
Escolha
cuidadosamente o que você lê, ouve e assiste. Questione as narrativas
dominantes, busque fontes primárias e cultive o hábito da reflexão.
A liberdade de pensamento é a última barreira contra o totalitarismo moderno, que não apenas vigia, mas molda a própria realidade percebida. Vigie a si mesmo para não ser manipulado.
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