Veneza: uma cidade erguida sobre pilares de madeira
A história de Veneza tem
início no século V d.C., em um período de profundas transformações na Europa.
Com a queda do Império Romano do Ocidente, sucessivas invasões de povos
bárbaros vindos do norte, como hunos, lombardos e visigodos, tornaram a vida
insegura nas antigas cidades do continente italiano.
Para escapar da violência e do
colapso das estruturas romanas, populações locais buscaram refúgio nos pântanos
da Lagoa de Veneza, uma região inóspita, alagadiça e aparentemente imprópria
para a habitação humana.
Os primeiros assentamentos
surgiram em ilhas arenosas como Torcello, Jesolo e Malamocco. Inicialmente,
esses núcleos eram considerados provisórios, usados apenas como abrigo
temporário.
No entanto, à medida que as
ameaças no continente persistiam e a vida lagunar se mostrava possível, os
habitantes passaram a se estabelecer de forma permanente. Assim, pouco a pouco,
nascia Veneza. Construir uma cidade sobre água exigiu soluções engenhosas.
Para garantir estabilidade às
edificações, os venezianos desenvolveram um método construtivo singular:
milhares de estacas de madeira eram cravadas verticalmente no solo arenoso e
lodoso da lagoa até atingir camadas mais firmes. Sobre essas estacas, eram
colocadas plataformas de madeira, que serviam de base para a construção dos
edifícios de pedra e tijolo.
Um livro técnico do século
XVII descreve minuciosamente esse processo e revela a dimensão colossal dessas
obras. Segundo a obra, somente para a construção da Igreja de Santa Maria della
Salute, iniciada em 1631, foram utilizadas 1.106.657 estacas de madeira, cada
uma com cerca de quatro metros de comprimento, todas cravadas sob a água.
O trabalho levou
aproximadamente dois meses apenas para a fundação. A madeira utilizada era
transportada por vias fluviais desde florestas distantes, localizadas nas
regiões que hoje correspondem à Eslovênia, Croácia e Montenegro, o que
evidencia a impressionante logística e o poder econômico da República de
Veneza.
À primeira vista, o uso da
madeira como principal elemento estrutural pode parecer paradoxal, já que ela é
considerada menos durável que a pedra ou o metal. No entanto, o segredo da longevidade
das fundações venezianas reside justamente no ambiente em que estão inseridas.
A decomposição da madeira
ocorre principalmente devido à ação de microrganismos, como fungos e bactérias que
necessitam de oxigênio para sobreviver. Como as estacas permanecem
permanentemente submersas, privadas de oxigênio, esse processo é drasticamente
reduzido.
Além disso, o contato contínuo
com a água salgada favorece um processo de mineralização ao longo dos séculos,
endurecendo a madeira e tornando-a extremamente resistente. Assim,
paradoxalmente, a água que ameaça Veneza é também a responsável por sustentar
suas bases há mais de mil anos.
Mais sobre Veneza
Veneza está localizada no
nordeste da Itália e é formada por um conjunto de 117 pequenas ilhas, separadas
por canais e interligadas por mais de 400 pontes. A cidade situa-se na Lagoa de
Veneza, uma extensa área pantanosa ao longo da costa do Mar Adriático, entre as
desembocaduras dos rios Po e Piave.
Sua singularidade
arquitetônica, artística e histórica levou parte da cidade e toda a lagoa a
serem reconhecidas como Patrimônio Mundial da Humanidade. Veneza é a capital da
região do Vêneto.
Em 2009, o município contava
com cerca de 270 mil habitantes, dos quais aproximadamente 60 mil residiam na
cidade histórica. A maioria da população vive na região continental, conhecida
como Terraferma, especialmente em Mestre e Marghera, além de outras ilhas da
lagoa.
Juntamente com Pádua e
Treviso, Veneza integra a área metropolitana conhecida como PATREVE, que reúne
cerca de 2,6 milhões de habitantes. O nome da cidade deriva do antigo povo dos vênetos,
que habitava a região desde o século X a.C.
Ao longo da história, Veneza
tornou-se a capital da poderosa República de Veneza, sendo conhecida por
títulos como La Serenissima, Rainha do Adriático, Cidade da
Água, Cidade Flutuante e Cidade dos Canais.
Durante a Idade Média e o
Renascimento, a República de Veneza foi uma das maiores potências marítimas do
mundo. Controlou rotas comerciais estratégicas, participou das Cruzadas, teve
papel decisivo na Batalha de Lepanto e tornou-se um centro essencial do
comércio de especiarias, seda e outros produtos orientais entre os séculos XIII
e XVII.
Essa prosperidade refletiu-se
em sua arquitetura monumental, nas artes plásticas e na vida cultural intensa. Após
as guerras napoleônicas e o Congresso de Viena, Veneza foi anexada ao Império
Austríaco.
Somente em 1866, após um
referendo decorrente da Terceira Guerra de Independência Italiana, passou a
integrar o Reino da Itália.
Veneza também ocupa um lugar
de destaque na história da música, especialmente da música sinfônica e da
ópera, sendo a cidade natal de Antônio Vivaldi, um dos maiores compositores do
período barroco.









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