Indiferença da Natureza Perante a Morte - Se houvesse um homem que
não pudesse morrer, e se fosse verdadeira a lenda do judeu errante, titubearíamos
em declará-lo o mais infeliz?
Assim se poderia explicar o
vazio da tumba; significaria que o mais infeliz é aquele que não pode morrer,
nem se refugiar num túmulo.
Kierkegaard
A vida e a morte, o nascer
e o morrer, é o maior jogo de dados que conhecemos; ansiosos, interessados,
agitados assistimos a cada partida, porque a nossos olhos tudo se resume nisso.
A natureza, pelo contrário,
que é sempre sincera e nunca mente, contempla a partida com ar indiferente, não
se preocupa com a morte ou a vida do indivíduo, entregando a vida do animal e
também a do homem a todos os acasos, não fazendo o mínimo esforço para
salvá-los.
Esmagamos sem querer o
inseto que se acha em nosso caminho; a lesma necessita de todo meio para se
defender, não pode fugir, esconder-se, nem enganar, está condenada a ser presa
de todos os seus inimigos.
O peixe saltita
tranquilamente na rede ainda aberta; o sapo devido a sua moleza não pode
salvar-se; o pássaro não vê o falcão voar sobre sua cabeça, nem a ovelha vê o
lobo que a espreita oculto na mata.
Todos esses animais
inofensivos e fracos, vivem no meio de perigos ignorados, dos quais podem ser
vítimas a todo momento.
A natureza exprime com esse
procedimento, no seu estilo lacônico, oracular, que lhe é indiferente a
destruição de seus seres, não podendo ser por eles prejudicada, e que em casos
semelhantes tão indiferente é o efeito como a causa.
Por isso abandona sem
defesa esses organismos, obras de uma arte eterna, à vontade do mais forte, aos
caprichos da sorte, à crueldade da criança, ao mau humor de um imbecil.
A natureza, mãe soberana e
universal de todo o criado, sabe que quando seus filhos sucumbem, voltam ao seu
seio, onde os conserva ocultos, expondo-os a mil perigos sem temor algum; a sua
morte é para ela um divertimento, um jogo.
A natureza é indiferente no
que se relaciona ao homem ou ao animal; não se deixa impressionar conosco,
durante a vida ou na morte.
Tampouco devíamos nos
comover porque fazemos parte dela. Schopenhauer
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