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segunda-feira, julho 28, 2025

Noite das Facas Longas - Expurgo na Alemanha Nazista



A Noite das Facas Longas: O Expurgo que Consolidou o Poder de Hitler na Alemanha Nazista

A Noite das Facas Longas, também conhecida como Noite dos Longos Punhais ou Röhm-Putsch (termo usado pela propaganda nazista), foi um expurgo político orquestrado pelo regime nazista na Alemanha entre 30 de junho e 2 de julho de 1934.

Esse evento marcou um momento crucial na consolidação do poder de Adolf Hitler, eliminando opositores internos e externos ao Partido Nazista e garantindo o apoio do exército alemão (Reichswehr).

Durante essa operação, codinomeada "Kolibri" (colibri), dezenas de pessoas foram executadas extrajudicialmente, e milhares de opositores políticos foram presos, consolidando a autoridade de Hitler como "juiz supremo do povo alemão".

Contexto Histórico e a Ascensão de Hitler

Após ser nomeado chanceler da Alemanha em 30 de janeiro de 1933 pelo presidente Paul von Hindenburg, Adolf Hitler deu início ao processo de Gleichschaltung (coordenação), que transformou a Alemanha em um estado unipartidário sob o controle do Partido Nazista.

Durante esse período, todos os partidos políticos rivais foram dissolvidos, e instituições democráticas, como sindicatos e a imprensa livre, foram suprimidas. No entanto, mesmo com o fortalecimento de seu poder político, Hitler enfrentava desafios significativos, tanto dentro quanto fora do partido.

A Sturmabteilung (SA), conhecida como "camisas-pardas" devido aos seus uniformes, era uma organização paramilitar do Partido Nazista que desempenhou um papel fundamental na ascensão de Hitler.

Formada a partir dos Freikorps, grupos nacionalistas de ex-combatentes da Primeira Guerra Mundial descontentes com o Tratado de Versalhes, a SA era liderada por Ernst Röhm, um aliado próximo de Hitler desde os primeiros dias do movimento nazista.

Sob o comando de Röhm, a SA cresceu exponencialmente durante a Grande Depressão, alcançando cerca de três milhões de membros em 1934. A organização era conhecida por sua violência nas ruas, frequentemente enfrentando comunistas e sociais-democratas em conflitos que desestabilizavam a já frágil República de Weimar.

Apesar de sua lealdade ao nazismo, a SA representava uma ameaça ao controle de Hitler. Röhm defendia uma "segunda revolução" que promoveria mudanças sociais radicais, incluindo a redistribuição de riqueza e a substituição do Reichswehr pela SA como o principal exército alemão.

Essa visão colocava Röhm em conflito direto com a cúpula militar, que via a SA com desprezo, considerando-a uma força desordeira e indisciplinada. Além disso, a homossexualidade assumida de Röhm, amplamente conhecida, era usada por seus inimigos como pretexto para desmoralizá-lo perante os setores conservadores da sociedade alemã.

O Conflito entre a SA e o Reichswehr

A tensão entre a SA e o Reichswehr, o exército oficial alemão limitado a 100 mil homens pelo Tratado de Versalhes, era um dos principais obstáculos à consolidação do poder de Hitler.

A cúpula militar, liderada por figuras como o general Werner von Blomberg, ministro da Defesa, e o presidente Hindenburg, via a SA como uma ameaça à sua autoridade. Röhm, por sua vez, sonhava em transformar a SA no núcleo de um novo exército nacional, absorvendo o Reichswehr.

Em janeiro de 1934, ele enviou um memorando a Blomberg propondo a fusão das duas forças, o que foi categoricamente rejeitado. A hostilidade entre as duas organizações era agravada pelas declarações públicas de Röhm.

Ele criticava abertamente os oficiais do Reichswehr, chamando-os de "velhos suínos" que deveriam ser substituídos por jovens leais ao nazismo. Em uma reunião em fevereiro de 1934, Hitler, sob pressão do exército, forçou Röhm a assinar um acordo reconhecendo a supremacia do Reichswehr.

No entanto, Röhm, em particular, desdenhou do acordo, chamando Hitler de "ridículo" e afirmando que não seguiria suas ordens. Além disso, setores conservadores da sociedade alemã, incluindo industriais e a elite política, estavam alarmados com a violência contínua da SA.

Mesmo após a consolidação do poder nazista, os "camisas-pardas" continuavam a aterrorizar as ruas, atacando opositores, bêbados e qualquer um que considerassem uma ameaça. Essas ações alienavam a classe média e os setores conservadores, que viam a SA como uma força desestabilizadora.

A Preparação para o Expurgo

A decisão de eliminar a SA e seus líderes foi impulsionada por uma coalizão de forças dentro do Partido Nazista, incluindo Heinrich Himmler (chefe da SS), Hermann Göring (premiê da Prússia e figura influente no partido) e Joseph Goebbels (ministro da Propaganda).

Esses líderes viam Röhm como uma ameaça à estabilidade do regime e ao controle absoluto de Hitler. Himmler, em particular, invejava o poder da SA e trabalhava para fortalecer a Schutzstaffel (SS), uma organização paramilitar de elite diretamente subordinada a Hitler.

Em abril de 1934, Göring transferiu o controle da polícia política da Prússia para Himmler, enfraquecendo ainda mais a influência de Röhm. Enquanto isso, a SS, sob a liderança de Reinhard Heydrich, começou a fabricar provas falsas de que Röhm planejava um golpe contra Hitler, supostamente financiado pela França com 12 milhões de marcos.

Essas acusações, embora infundadas, serviram como justificativa para o expurgo. A pressão para agir contra Röhm aumentou em junho de 1934, quando o vice-chanceler Franz von Papen, um conservador aliado de Hindenburg, fez um discurso na Universidade de Marburg criticando o regime nazista e alertando sobre o risco de uma "segunda revolução" liderada pela SA.

Esse discurso enfureceu Hitler e intensificou a percepção de que a SA representava uma ameaça iminente. Hindenburg, por sua vez, ameaçou impor a lei marcial caso Hitler não controlasse a situação, o que poderia enfraquecer o regime nazista.

Em 26 de junho, Hitler, Himmler e Göring finalizaram a lista de alvos do expurgo, que incluía não apenas líderes da SA, mas também opositores políticos, como ex-nazistas, conservadores e figuras ligadas à antiga elite de Weimar.

No dia seguinte, Hitler colocou suas forças em alerta e planejou a operação, que deveria ser rápida e discreta. O codinome "Kolibri" foi escolhido aleatoriamente para designar a missão.

A Execução do Expurgo

Na madrugada de 30 de junho de 1934, Hitler liderou pessoalmente a operação em Munique. Acompanhado por tropas da SS e da polícia, ele dirigiu-se ao hotel em Bad Wiessee, onde Röhm e outros líderes da SA estavam reunidos.

Chegando ao local, Hitler invadiu o quarto de Röhm, acordando-o e declarando sua prisão. Outros líderes da SA, como Edmund Heines, foram detidos, alguns em circunstâncias humilhantes, como no caso de Heines, encontrado na cama com um jovem subordinado.

Em Munique, Hitler destituiu líderes da SA de seus cargos e confiscou suas insígnias. Enquanto isso, em Berlim, Göring e Himmler coordenavam a operação, com a Gestapo (polícia secreta nazista) e a SS executando prisões e assassinatos.

Entre as vítimas estavam Kurt von Schleicher, ex-chanceler, e sua esposa, mortos em sua casa; Gregor Strasser, líder da ala strasserista do Partido Nazista, que defendia um nazismo mais "socialista"; e Gustav Ritter von Kahr, que havia frustrado o Putsch da Cervejaria em 1923.

Até mesmo figuras menos relevantes, como o crítico musical Willi Schmid, foram mortos por engano, confundidos com alvos políticos. Em Berlim, a Gestapo invadiu o gabinete do vice-chanceler Franz von Papen, executando seu secretário, Herbert von Bose, e o autor de seu discurso, Edgar Jung. Papen foi preso, mas liberado dias depois sob a condição de não criticar o regime.

Outros alvos incluíam líderes católicos, como Erich Klausener, e opositores de longa data do nazismo. O destino de Ernst Röhm foi selado em 2 de julho. Preso na prisão de Stadelheim, em Munique, ele recebeu a visita de Theodor Eicke (futuro comandante do campo de concentração de Dachau) e outro oficial da SS, que lhe ofereceram uma pistola para cometer suicídio.

Röhm recusou, desafiando-os a dizer que, se deveria morrer, Hitler deveria fazê-lo pessoalmente. Após dez minutos sem resposta, Eicke retornou e atirou em Röhm à queima-roupa.

Consequências e Reações

Oficialmente, o regime nazista relatou 85 mortes durante a Noite das Facas Longas, mas historiadores estimam que o número real pode ter chegado a centenas, com milhares de prisões.

A operação foi conduzida com brutal eficiência pela SS e pela Gestapo, consolidando o poder dessas organizações dentro do regime. A eliminação da SA como força política independente marcou o fim de sua influência e a ascensão da SS como o principal instrumento de repressão do nazismo.

O expurgo garantiu o apoio irrestrito do Reichswehr a Hitler. Em 13 de julho de 1934, em um discurso no Reichstag, Hitler justificou as execuções como uma medida de "autodefesa do Estado" contra uma suposta conspiração liderada por Röhm.

Ele declarou-se o "juiz supremo do povo alemão", consolidando sua autoridade absoluta. A propaganda nazista, liderada por Goebbels, apresentou o expurgo como uma ação necessária para salvar a Alemanha do caos, enquanto tentava suprimir informações detalhadas sobre as mortes.

A reação pública foi mista. O exército, aliviado pela eliminação da SA, aplaudiu a operação, apesar da morte de dois generais, Kurt von Schleicher e Ferdinand von Bredow.

Hindenburg enviou um telegrama a Hitler expressando sua "profunda gratidão". No entanto, muitos alemães, especialmente a classe média, ficaram horrorizados com a brutalidade das execuções, embora alguns admirassem a "coragem" de Hitler em agir decisivamente.

A imprensa, controlada pelo regime, limitou-se a divulgar a narrativa oficial, mas rumores sobre a violência se espalharam rapidamente. A SA foi reorganizada sob o comando de Viktor Lutze, um líder fraco que seguiu ordens estritas de Hitler para reduzir a influência da organização.

A SA foi proibida de realizar atos de violência e extravagâncias, como banquetes e uso de limusines. Seu efetivo caiu de três milhões em 1934 para 1,2 milhão em 1938, e seu papel foi reduzido a atividades cerimoniais. Todas as referências a Röhm foram apagadas, com a substituição de seu nome por lemas como "Blut und Ehre" (sangue e honra).

Impacto de Longo Prazo

A Noite das Facas Longas foi um divisor de águas na história da Alemanha Nazista. Ela eliminou qualquer possibilidade de oposição interna significativa ao regime e consolidou a lealdade do Reichswehr, pavimentando o caminho para a militarização agressiva da Alemanha nos anos seguintes.

Além disso, o expurgo marcou o abandono definitivo de qualquer pretensão "socialista" dentro do nazismo, alinhando o regime aos interesses das elites industriais e militares.

O evento também teve implicações jurídicas profundas. O ministro da Justiça, Franz Gürtner, promulgou uma lei retroativa legalizando os assassinatos como "atos de autodefesa do Estado", legitimando a suspensão do estado de direito.

Essa medida abriu precedentes para a erosão completa das garantias legais na Alemanha, permitindo que o regime nazista operasse sem restrições judiciais.

A Noite das Facas Longas também serviu como um aviso à população alemã e aos opositores do regime. Qualquer resistência, mesmo que moderada, seria punida com violência extrema.

Esse clima de medo sufocou a formação de uma oposição organizada nos anos seguintes, enquanto a SS e a Gestapo consolidavam seu papel como instrumentos de repressão.

Legado

A Noite das Facas Longas permanece como um dos episódios mais sombrios da ascensão do nazismo, ilustrando a brutalidade e a determinação de Hitler em eliminar qualquer obstáculo ao seu poder.

O evento não apenas consolidou sua ditadura, mas também revelou a natureza do regime nazista: um sistema baseado na violência, na manipulação e na eliminação sistemática de dissidências. A expressão "Noite das Facas Longas" deriva de uma canção da SA que celebrava a violência, mas tornou-se sinônimo de traição e repressão política.

O impacto do expurgo reverberou além das fronteiras da Alemanha, sinalizando ao mundo a natureza implacável do regime nazista. Para os historiadores, a Noite das Facas Longas é um marco na transição da Alemanha de uma democracia frágil para uma ditadura totalitária, consolidando o caminho para os horrores que culminariam na Segunda Guerra Mundial e no Holocausto.

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