Masabumi Hosono (1870-1939) é lembrado hoje
como um dos sobreviventes mais injustamente julgados do naufrágio do RMS
Titanic, ocorrido na noite de 14 para 15 de abril de 1912. Funcionário do
Ministério dos Transportes do governo japonês, ele era o único passageiro
japonês a bordo do navio.
Após uma missão de dois anos na Rússia, onde
estudou o sistema ferroviário estatal, Hosono embarcara no Titanic em
Southampton, como passageiro de segunda classe, ansioso para retornar à família
em Tóquio.
Na noite da tragédia, acordado por um
comissário, Hosono tentou acessar o convés dos botes salva-vidas, mas foi
barrado por tripulantes que, confundindo-o com um passageiro de terceira classe
devido à sua aparência estrangeira, o mandaram para os decks inferiores.
Apesar disso, ele conseguiu subir novamente e
testemunhou o caos: sinalizadores iluminando o céu, gritos de pânico e botes
sendo lançados. Em sua carta à esposa, escrita em papel timbrado do Titanic e
completada no navio de resgate Carpathia, Hosono descreveu o dilema interno:
"Eu me afundei em pensamentos desolados
de que não veria mais minha amada esposa e filhos, pois não havia alternativa
senão compartilhar o destino do Titanic".
Ele se preparou para morrer com dignidade,
decidindo "não deixar nada de vergonhoso como súdito japonês". No
entanto, ao ver o bote salva-vidas número 10 (um dos últimos a ser baixado) com
vagas disponíveis, ouviu um oficial gritar "Espaço para mais dois!".
Um homem saltou primeiro, e Hosono,
impulsionado pelo instinto de sobrevivência, o seguiu: "O exemplo do
primeiro homem me levou a aproveitar essa última chance".
Resgatado pelo Carpathia, Hosono sobreviveu,
mas sua história tomou um rumo trágico ao retornar ao Japão. Influenciada pelo
ideal ocidental de "mulheres e crianças primeiro" - popularizado no
Japão pelo livro Self-Help do escocês Samuel Smiles -, a sociedade da era Meiji
via a sobrevivência de um homem adulto como covardia, especialmente quando
tantas mulheres e crianças pereceram.
A imprensa japonesa o rotulou de covarde, ele
foi demitido do cargo público (embora posteriormente recontratado em regime
parcial), e sofreu ostracismo social conhecido como mura hachibu. Seu caso foi
citado em livros escolares como exemplo de comportamento vergonhoso, e até um professor
de ética o denunciou publicamente como imoral.
O estigma persistiu por décadas: em 1954,
quando outro navio japonês afundou, Hosono foi novamente vilipendiado pela
mídia. Ele morreu em 1939, aos 68 anos, carregando o peso de se sentir uma
desgraça para a família e o país. Somente na década de 1990, com o renovado
interesse pelo Titanic impulsionado pelo filme de James Cameron (1997), a
família Hosono divulgou publicamente sua carta detalhada.
O documento revelou um homem atormentado pelo
dilema entre dever patriótico e amor familiar, ajudando a remar o bote e
sofrendo com os gritos dos afogando. Seu neto, o músico Haruomi Hosono (membro
da banda Yellow Magic Orchestra), declarou aliviado:
"A honra foi restaurada aos
Hosono". Hoje, a história de Masabumi é vista como um exemplo de injustiça
cultural, destacando como valores importados do Ocidente colidiram com
expectativas sociais, punindo um sobrevivente por simplesmente escolher viver.
Sua carta permanece como um dos relatos mais humanos e comoventes da tragédia, escrita parcialmente no próprio papel do navio condenado.









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