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domingo, setembro 21, 2025

Uma Anistia Fake


 

Quando o deputado Hugo Motta, presidente da Comissão da Câmara dos Deputados, anunciou que pautaria a votação da urgência do projeto de anistia aos condenados pelos eventos de 8 de janeiro de 2023, ficou evidente que algo de questionável estava por vir.

E não deu outra. A movimentação política por trás dessa proposta, que envolve figuras como Michel Temer, Paulinho da Força e Aécio Neves, levanta sérias dúvidas sobre sua legitimidade e intenções. Como algo poderia ser levado a sério com esses nomes no centro da articulação?

O que está em jogo não é uma anistia genuína, mas um arremedo legislativo que parece mais uma manobra para apaziguar interesses específicos do que para promover justiça ou pacificação nacional.

A proposta, que deveria buscar a reconciliação após um dos episódios mais graves da recente história política brasileira, transforma-se em uma tentativa de calar a oposição e proteger aliados.

No entanto, acredito que essa estratégia não terá o sucesso esperado pelos articuladores, pois a sociedade e parte da classe política estão atentas às reais intenções por trás do projeto.

Paulinho da Força, um dos principais defensores da proposta, tenta vender a ideia de que se trata de uma “pacificação” necessária para o país. Na prática, porém, o que se observa é uma manobra vergonhosa que desvirtua o conceito de anistia.

Em vez de abordar de forma ampla e transparente as questões relacionadas às condenações do 8 de janeiro, o projeto propõe uma espécie de “dosimetria” - um remendo jurídico que manipula as penas, reduzindo-as de maneira seletiva, sem enfrentar o cerne da questão: a polarização política e a alegada perseguição judicial contra determinados grupos.

Paulinho já admitiu publicamente que “não pode salvar individualmente Bolsonaro”, mas insiste em ajustes pontuais nas penas, como se reduzir alguns anos de condenação fosse suficiente para apaziguar o debate sobre a suposta instrumentalização do Judiciário contra adversários políticos.

Vale lembrar que o projeto de anistia surge em um contexto de alta tensão. Os eventos de 8 de janeiro, quando manifestantes invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes em Brasília, foram amplamente condenados, mas também geraram debates sobre a proporcionalidade das punições aplicadas.

Centenas de pessoas foram presas, muitas sem antecedentes criminais, e enfrentam penas severas, enquanto figuras de maior destaque político, como o ex-presidente Jair Bolsonaro, seguem sob investigação. A proposta de anistia, portanto, não é apenas sobre os réus menos conhecidos, mas também sobre o impacto político que essas condenações têm no cenário nacional.

Além disso, a participação de figuras como Michel Temer, ex-presidente conhecido por sua habilidade em articulações nos bastidores, e Aécio Neves, cuja trajetória política é marcada por controvérsias, reforça a percepção de que o projeto pode servir mais a interesses partidários do que à justiça.

Temer, por exemplo, tem histórico de atuar como mediador em crises políticas, mas sua presença nesse debate levanta questionamentos sobre possíveis acordos que favoreçam o establishment político em detrimento de uma solução equânime.

Já Aécio, que já enfrentou denúncias graves no passado, parece buscar na anistia uma forma de consolidar sua influência em um momento de fragilidade de sua imagem pública. Outro ponto crítico é o timing da proposta.

A votação da urgência na Câmara ocorre em um momento em que o governo Lula enfrenta desafios para manter sua base coesa no Congresso, enquanto a oposição tenta capitalizar a insatisfação de setores da sociedade com o que chamam de “perseguição política”.

Assim, o projeto de anistia pode ser visto como uma moeda de troca em negociações mais amplas, o que compromete ainda mais sua legitimidade. No final das contas, a tentativa de transformar a anistia em uma mera revisão de penas é um erro estratégico.

Não apenas porque desrespeita a gravidade dos eventos de 8 de janeiro, mas também porque subestima a capacidade da sociedade de perceber as intenções por trás dessa articulação.

A verdadeira pacificação exigiria um debate honesto e amplo, que considerasse tanto a necessidade de responsabilização pelos atos antidemocráticos quanto à possibilidade de excessos judiciais.

Enquanto isso, o que temos é um jogo político que, longe de unir o país, apenas aprofunda a desconfiança nas instituições.

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