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domingo, dezembro 07, 2025

Latif Yahia Sósia de Uday Hussein


 

Latif Yahia: o homem que foi obrigado a ser Uday Hussein

Latif Yahia nasceu em 14 de junho de 1964, em uma família curda de classe média em Bagdá. Oficial do Exército iraquiano, lutou na frente de batalha durante a Guerra Irã-Iraque (1980-1988). Era tenente, culto, falava inglês fluente e tinha um rosto que, para seu azar, era quase idêntico ao do filho mais velho de Saddam Hussein: Uday.

Os dois tinham sido colegas na mesma escola de elite em Bagdá nos anos 1970. Já naquela época os outros alunos brincavam: “Latif, você é o Uday sem dinheiro e sem loucura.” Ninguém imaginava que a piada um dia se tornaria sentença de morte.

O dia em que o chamaram ao palácio

Em 1987, no auge da guerra, Latif recebeu uma ordem direta do comando militar: apresentar-se imediatamente no Palácio Republicano. Achou que seria convocado para uma missão especial na frente de batalha. Chegou de uniforme, orgulhoso, barba bem feita.

Foi levado a uma sala sem janelas. Lá estava Uday em pessoa, sorrindo como quem escolhe um terno novo. “Salam aleikum, Latif”, disse Uday, dando um tapa amigável no ombro do tenente. “A partir de hoje você vai ser eu quando eu não quiser morrer.” Latif riu, achando que era brincadeira. Uday não riu. Recusou na hora.

“Eu sou oficial do Exército, não ator de teatro.” Resposta errada. Foi jogado em uma cela de 2 × 2 metros embaixo do palácio. Sem luz, sem visitas, comida podre jogada uma vez por dia. Oito meses depois, quando já não conseguia mais ficar de pé, assinaram o contrato com o próprio sangue: Latif aceitou.

Seis meses virando monstro

Submeteram-no a um treinamento brutal: Fonoaudiólogos para copiar exatamente o jeito de Uday falar (rápido, sibilante, com aquele sotaque arrogante de Bagdá rico). Cirurgias plásticas no nariz e no queixo.

Implantes dentários para reproduzir o sorriso torto e os dentes de ouro de Uday. Aulas de postura, de como acender o charuto cubano, de como bater em empregados sem deixar marcas visíveis.

Ao fim, quando colocaram os dois lado a lado diante do espelho, até Saddam confundiu os dois por alguns segundos. “Perfeito”, disse o ditador. “Agora meu filho tem sete vidas.”

Basra, 1990: o primeiro teste de fogo

Durante a invasão do Kuwait, Uday tinha pavor de ir à linha de frente. Mandaram Latif. Em Basra, sob fogo cerrado iraniano, o “Uday” apareceu de Lamborghini branco, óculos Ray-Ban, keffiyeh vermelha, distribuindo maços de dólares e uísque escocês às tropas. Os soldados enlouqueceram de alegria. Naquela noite, Latif tomou tantos tiros de festim e gritos de “Ya Uday! Ya lion!” que quase acreditou ser ele mesmo o filho do presidente.

Quando voltou a Bagdá, Uday deu um tapa nas costas dele: “Você é melhor do que eu, seu filho da puta. Quase me matou de inveja.”

O monstro por dentro

Latif viu coisas que nenhum ser humano deveria ver. Em uma festa no palácio, Uday apontou para uma adolescente de 14 anos que dançava: “Quero aquela.”

Na manhã seguinte, a menina foi devolvida à família em pedaços dentro de um saco de lixo. Uday ria enquanto contava os detalhes. Em 1996, já exilado na Europa, Latif deu uma entrevista histórica ao programa HARDtalk da BBC.

Olhos fundos, voz tremendo de ódio, ele disse: “Uday não era um psicopata. Psicopata tem método. Uday era pior: era o mal puro. Uma vez pegou uma das mulheres mais bonitas do Iraque, violentou-a durante dias, mandou arrancar os dentes dela com alicate e, quando se cansou, jogou o corpo para os cães na rua. Eu vi. Eu estava lá, fingindo ser ele.”

Fuga e o filme

Latif desertou em 1991, durante a revolta xiita após a Guerra do Golfo. Cruzou a fronteira para a Turquia com ajuda de curdos, levou quatro balas no corpo e sobreviveu. Em 2011, sua história virou o filme O Duplo do Diabo (título original: The Devil’s Double), dirigido por Lee Tamahori e com Dominic Cooper no papel duplo de Uday/Latif.

O próprio Latif disse, ao ver o filme: “Eles suavizaram. A realidade foi mil vezes pior.” Hoje, com mais de 60 anos, Latif Yahia vive na Europa, casado, com filhos que nunca conheceram o avô Saddam.

Ainda recebe ameaças. Ainda acorda gritando à noite. Porque há coisas que nem mil cirurgias plásticas conseguem apagar: o rosto que ele foi obrigado a usar não era só o de Uday. Era o do diabo em pessoa.

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