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sábado, novembro 22, 2025

O Culto à Passividade e a Ascensão dos Predadores


 

“Uma sociedade de carneiros acaba gerando um governo de lobos.”
(Victor Hugo)

A frase de Victor Hugo, escrita no século XIX, parece cada vez mais atual. Quando um povo abdica da vigilância, do pensamento crítico e da coragem cívica, abre-se a porta para que os mais predadores ascendam ao poder. Não é necessária uma grande conspiração; basta apatia.

A história está cheia de exemplos. A República de Weimar, exausta e humilhada após 1918, preferiu acreditar em promessas de grandeza em vez de enfrentar a dura realidade da reconstrução democrática.

O resultado é conhecido: em poucos anos, um cabo austríaco, sem maioria absoluta nas urnas, transformou-se em ditador absoluto. Os alemães não eram especialmente maus; eram, em grande parte, conformados, assustados e obedientes. Tornaram-se carneiros - e os lobos assumiram o rebanho.

Esse padrão se repete em diferentes épocas e latitudes.

A Venezuela de Hugo Chávez começou com um povo cansado da corrupção e da desigualdade, mas que aceitou trocar liberdade por um líder que prometia justiça social imediata e milagres políticos.

Pouco a pouco, as instituições foram esvaziadas, a oposição sufocada, a imprensa calada. Hoje, quem ousa balir fora do coro corre o risco de ser devorado.

A Rússia pós-soviética, traumatizada pelo colapso econômico dos anos 1990, aceitou abdicar de liberdades em nome da “estabilidade”. Em troca, recebeu um ex-agente da KGB disposto a restaurar a grandeza nacional.

Vinte e cinco anos depois, o país vive sob um regime que combina a rigidez autoritária do século XX com as ferramentas tecnológicas de vigilância do século XXI. Carneiros monitorados - e lobos cada vez mais confiantes. Mesmo em democracias consolidadas o fenômeno se manifesta, ainda que de forma mais sutil.

Quando a sociedade se fragmenta em tribos que só consomem informações que confirmam seus próprios preconceitos; quando o debate público se degrada em gritos; quando a verdade se torna apenas “versões”, cria-se o terreno perfeito para que líderes autoritários, populistas ou simplesmente corruptos prosperem.

Eles não precisam de tanques nas ruas: basta explorar o medo, a preguiça intelectual e o conformismo. O lobo não precisa ser brilhante. Ele só precisa que os carneiros tenham medo de se distinguir do rebanho - ou, pior, que achem mais confortável baixar a cabeça.

A lição de Victor Hugo é dura, mas cristalina: a liberdade não se sustenta apenas com instituições. Ela se mantém viva graças a cidadãos que se recusam a ser carneiros.

Um povo que fiscaliza, que questiona, que se indigna, que estuda, que vota com consciência e que, se preciso, ocupa as ruas, esse povo não produz lobos - produz governantes minimamente responsáveis, ou ao menos limitados por uma sociedade vigilante.

Mas um povo que deseja apenas paz e pão, sem perguntar o preço da paz e de onde vem o pão, inevitavelmente acaba governado por lobos.

E, como lembrava outro francês, Alexis de Tocqueville, “o preço da liberdade é a eterna vigilância”. Quem se cansa de vigiar, um dia acorda dentro da jaula - perguntando-se como foi parar ali.

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