A gente
tinha sonhos diferentes das baratas. Queríamos descobertas e ciência, mas
acabamos inventando muito plástico e muitas bombas; muita dominação entre nós
mesmos.
Elas só
tinham fome de comida, e agora estão aí aos milhares, saídas de tudo quanto é
toca e de tudo quanto é desvão dos prédios carcomidos. Também tínhamos
diferente desses bichos, eu acho, a ideia de um outro mundo melhor; se não
místico, pelo menos mais filosófico.
Naquele
dia, acredito que fiquei numa espécie de olho do furacão enquanto toda história
se despedaçava em volta da guerra de nêutrons e de vírus. Depois, procurei por
todos, vozes, imagens; alguém falando a respeito do acontecimento.
Só
escutava o vento; nenhum pássaro capaz de devorar esses irritantes bichos com
seus voos asquerosos. Após alguns anos, já nem sei se sobrevivi, ou se a vida
toda se transportou a outro lugar e eu fiquei aqui comendo enlatados nessa
terra sem carne e sem vegetais.
Recuso-me
a experimentar “las cucarachas”; espero que elas também não estejam aí me avaliando.
Devíamos ter pesquisado muito mais a carapaça, que parecia fracamente blindada
das baratas, elas estão conseguindo, por enquanto, herdar a Terra.
Mas,
até elas, parecem que ficam me perguntando desconfiadas; E aí cadê a produção
do nosso lixo. Muitos sabiam, achando que seria só do lado de lá, que estava
sendo planejada uma guerra controlada, modegamra, contra a superpopulação
humana que produzia montanhas de lixo e contaminava todas as fontes de água
potável; mas algo saiu errado com os antídotos.
Apenas
nos três dias inicialmente previstos para a duração dos vírus, eles consumiram
quase toda a população da Terra; menos o último homem, evidentemente.
O
progresso da ciência foi se tornando atraso da humanidade; o homem se tornou
apenas um subproduto e se alguém contrariasse a fabricação de supérfluos e se
preocupasse com o desaparecimento gradativo das abelhas e das flores.
Falasse
com bom senso, ou tivesse apreensões ecológicas, logo lhe recaía o sarcasmo de
homens circunspetos, mas ambiciosos do lucro ilimitado da produção em série; esse
aí é um fantasista.
As
alienações se somavam umas às outras; ninguém levou a sério o discurso
excêntrico de um orador a respeito da continuidade do homem, dizia ele;
Dinossauros habitaram milhões de anos na Terra e sumiram; talvez a função do
homem seja a de desenterrar petróleo e produzir bastante plástico e muito lixo
e depois também sumir.
Quase
acertou. Eu continuo escrevendo, apenas como espécie de desabafo; ninguém mais
vai ler. Releio meus pensamentos esparramados em folhas brancas; restinhos de
celulose que escondo da avidez das marrons.
Também
reflito no amor que alguém havia guardado para alguém. Será que ele estará a
salvo no meio dessas ruínas, ou sumiu também o amor.
Esse
texto que imaginei, não é mais uma dessas utopias de quem tem preocupações
ecológicas, mas lhe falta energia e recursos para lutar contra a máquina
produtiva cega.
Tampouco
se trata de um acesso repentino de sabedoria obtida de pesquisas. Ele trata
apenas da antecipação dos resultados da apatia, exceto financeira, em todos os
setores econômicos, educacionais e legais da atualidade.
Felizmente continuamos vivos nesta boa e velha Terra, mas rumamos diretamente ao caos, na ânsia de produzir, ou consumir, sem nunca parar para pensar; que nem baratas tontas.(Vilnei Maria Ribeiro de Moraes)
0 Comentários:
Postar um comentário