O Último Homem e as Baratas: Uma Fábula do Fim
A humanidade sonhava com descobertas, ciência e
progresso, mas seus sonhos se desviaram. Queríamos explorar o cosmos, curar
doenças e construir um mundo melhor - talvez não místico, mas ao menos mais
sábio, mais filosófico.
No entanto, nossas criações foram outras: montanhas de
plástico, bombas devastadoras e uma incessante luta por dominação entre nós
mesmos. Enquanto isso, as baratas, movidas apenas pela fome primal,
multiplicavam-se silenciosamente nos desvãos dos prédios carcomidos, nos
esgotos e nas ruínas do que chamávamos de civilização.
Eu me lembro daquele dia, o dia em que o mundo se
despedaçou. Estava no olho do furacão, um ponto de silêncio enquanto a história
ruía ao meu redor. Uma guerra de nêutrons e vírus, planejada como uma solução
"controlada" para a superpopulação e o excesso de lixo, escapou ao
controle.
Os antídotos falharam. Em apenas três dias, os vírus
consumiram quase toda a população da Terra, deixando para trás um silêncio
ensurdecedor, quebrado apenas pelo vento e pelo zumbido das baratas.
Não havia mais pássaros para devorá-las, nem vozes humanas,
nem imagens de esperança. Apenas eu, o último homem, ou talvez um eco preso em
um mundo que já não existe.
A Sobrevivência em um Mundo sem Vida
Agora, vivo entre latas de enlatados, os últimos
vestígios de um tempo em que a terra produzia carne e vegetais. Recuso-me a
comer "las cucarachas", embora seus olhos minúsculos pareçam me
observar, como se me avaliassem como eu as avalio.
Elas, com suas carapaças aparentemente frágeis, mas
resistentes ao apocalipse, herdaram a Terra. Sobrevivem onde nós falhamos,
alimentando-se dos restos do nosso excesso.
Às vezes, sinto que elas me perguntam, com um sarcasmo
biológico: "Cadê o lixo que vocês prometeram?" Escrevo estas palavras
em pedaços de papel, restos de celulose que escondo da avidez das baratas
marrons.
Não sei se sobrevivi de fato ou se a vida se
transportou para outro plano, deixando-me aqui, um náufrago em um planeta
deserto. Releio meus pensamentos como um desabafo, sabendo que ninguém os lerá.
Reflito sobre o amor, aquele sentimento que alguém, em
algum lugar, guardava para outro. Será que ele sobreviveu entre as ruínas, ou
também foi consumido pelo caos?
O Progresso que se Tornou Atraso
A ciência, que prometia emancipação, tornou-se o
atraso da humanidade. Transformamos o progresso em uma máquina cega de
produção: plástico, lixo, poluição.
As abelhas desapareceram, as flores murcharam, e as
fontes de água potável foram envenenadas. Aqueles que alertavam para o colapso -
os que falavam com bom senso, com apreensões ecológicas - eram ridicularizados
como "fantasistas" por homens ambiciosos, obcecados pelo lucro
imediato.
A produção em série, movida pela ganância, ignorou os
sinais de um planeta em colapso. Um orador excêntrico, cuja voz foi abafada
pelo sarcasmo, certa vez disse: "Os dinossauros habitaram a Terra por
milhões de anos e sumiram.
Talvez a função do homem seja desenterrar petróleo,
produzir plástico e lixo, e depois desaparecer." Ele quase acertou. O
homem tornou-se um subproduto de sua própria ganância, um mero catalisador da
destruição. As baratas, com sua simplicidade instintiva, provaram-se mais aptas
à sobrevivência.
Contexto Histórico e Crítica Social
A narrativa reflete um futuro distópico, mas suas
raízes estão no presente. Desde a Revolução Industrial, a humanidade
intensificou a exploração dos recursos naturais, produzindo quantidades
insustentáveis de resíduos.
No século XX, a ascensão do plástico - um material
revolucionário, mas praticamente indestrutível - transformou o planeta em um
depósito de lixo. Estima-se que, até 2025, mais de 8 bilhões de toneladas de
plástico tenham sido produzidas, grande parte descartada em oceanos e aterros,
sufocando ecossistemas.
A superpopulação, um tema recorrente em debates
científicos e políticos, foi abordada em teorias controversas, como as de
Thomas Malthus no século XVIII, que alertava para o crescimento populacional
insustentável.
No século XXI, a crise climática e a poluição
intensificaram essas discussões, com alguns defendendo soluções radicais, como
o controle populacional. A "guerra controlada" mencionada no texto
evoca experimentos hipotéticos de bioengenharia que, na ficção, escapam ao
controle, como em romances distópicos como Admirável Mundo Novo ou 1984.
A metáfora das baratas é poderosa. Esses insetos,
conhecidos por sua resiliência, sobrevivem a condições extremas, incluindo
radiação. Estudos indicam que baratas podem resistir a doses de radiação até 10
vezes maiores que humanos, o que as torna candidatas a "herdar a
Terra" em cenários apocalípticos.
Elas simbolizam a ironia de nossa queda: enquanto
sonhávamos com utopias, fomos superados por criaturas movidas apenas pela
sobrevivência.
Ampliação da Narrativa: Um Olhar para o Passado e o Futuro
Para enriquecer a história, podemos imaginar o último
homem como um cientista ou escritor que, antes do colapso, tentou alertar o
mundo. Talvez ele fosse um ecologista que publicava artigos ignorados, ou um
poeta cujas palavras sobre a natureza eram vistas como romantismo inútil.
Ele poderia ter guardado um caderno com memórias de um
tempo em que as florestas ainda cantavam com pássaros e os rios corriam limpos.
Agora, suas anotações são um testemunho solitário, um grito preso em papéis que
as baratas ameaçam consumir.
O texto também pode ser expandido com um evento
específico que desencadeou a catástrofe. Talvez a "guerra de nêutrons e
vírus" tenha sido um experimento secreto de uma coalizão de nações,
visando reduzir a população para salvar recursos.
Os antídotos, testados em laboratórios de alta
tecnologia, falharam devido a um erro humano ou a uma mutação imprevista do
vírus. Em três dias, a civilização colapsou, deixando cidades vazias e mares de
plástico como monumentos de nossa arrogância.
Reflexões para o Presente
Este texto não é uma utopia, nem uma súbita revelação
científica. É um alerta, uma antecipação dos frutos da apatia. Vivemos em um
mundo onde a produção e o consumo desenfreados seguem sem pausa, enquanto os
sinais de colapso - aquecimento global, extinção de espécies, poluição - são
ignorados em nome do lucro.
Como as baratas tontas, corremos em círculos,
obcecados por acumular, sem refletir sobre as consequências. A mensagem do
texto é um convite à ação. Ainda estamos na "boa e velha Terra", mas
o caos se aproxima se não mudarmos.
Precisamos ouvir os "oradores excêntricos" -
cientistas, ativistas, artistas - que nos pedem para proteger as abelhas, as
florestas e os oceanos. A gratidão pela natureza, pelo equilíbrio do planeta,
deve substituir a ganância. O amor, que o narrador questiona, pode ser nossa
salvação: amor pelo mundo, pelos outros, pelo futuro.
Conclusão
A fábula do último homem e das baratas é um espelho de
nossas escolhas. Enquanto sonhávamos com conquistas grandiosas, esquecemos de
cuidar do que nos sustenta.
As baratas, com sua resiliência humilde, zombam de
nossa arrogância, sobrevivendo onde falhamos. Mas ainda há tempo. Que este
texto nos inspire a refletir, a agir e a redescobrir o amor pela Terra, antes
que nos tornemos apenas uma nota de rodapé na história de um planeta que, sem
nós, seguirá girando.
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