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sábado, outubro 05, 2024

Solidão



Solidão da Minha Janela

Na janela do meu quarto, os olhos fixos na vastidão do horizonte, contemplo a natureza e seus fenômenos, tentando decifrar seus mistérios. Há algo de hipnótico na maneira como o mundo se revela diante de mim, como se cada movimento do céu ou sussurro do vento carregasse segredos que nunca compreenderei por completo.

O sol desce lentamente, preguiçoso, como se relutasse em abandonar o dia. Suas luzes douradas dançam sobre as águas do mar, tingindo-as com um rubor que aos poucos se transforma em vermelho púrpura, profundo e quase sobrenatural.

Então, como se exaurido, o crepúsculo cede lugar a tons acinzentados, prenunciando as sombras da noite que se aproximam. Observo tudo com um olhar pesado, carregado de uma melancolia que não explica sua origem, mas que se instala em mim como um velho conhecido.

As folhas das árvores, lá fora, tremem agitadas por um vento furioso que parece carregar lamentos. O som que produzem é como um coro distante, um murmúrio que ecoa a tristeza que habita meu peito.

Há algo de desolador na paisagem que se desenha diante de mim, como se a própria natureza compartilhasse do meu desânimo. Meu rosto, refletido vagamente no vidro da janela, carrega as marcas dessa nostalgia que me consome.

Talvez não seja prudente gastar as horas assim, perdido em pensamentos que só aprofundam minha solidão. Mas uma tarde melancólica como esta tem o poder de me arrastar para dentro de mim mesmo.

O cenário, com sua beleza trágica, parece conspirar para que eu me entregue a essa introspecção. A tristeza, minha eterna companheira, não me abandona. Nos momentos de calmaria, quando o mundo silencia, as lembranças do passado emergem como ondas, puxando-me para um tempo que não volta mais.

Houve um momento em que a vida parecia cheia de promessas. Sonhei alto, imaginei futuros grandiosos, acreditei que o mundo poderia ser moldado pelas minhas mãos. Mas os anos se acumularam, pesados, como folhas secas caindo sobre um outono sem fim.

Nada do que almejei se concretizou. Cada sonho não realizado é uma pedra a mais no fardo que carrego. Sinto o peso da decepção, a amargura do fracasso, a impotência diante de um destino que não escolhi.

Agora, a noite já se instalou, densa e silenciosa. Permaneço na janela, os olhos fixos no céu negro, salpicado de estrelas que brilham com uma frieza indiferente. Estou exausto da luta. A vida, com suas promessas quebradas, não foi gentil comigo.

Amei alguém, um amor tão profundo que parecia eterno. Mas a morte, cruel e inevitável, roubou-a de mim. Fecho os olhos e vejo as estrelas, não mais no céu, mas piscando sobre a sepultura onde ela repousa.

Imagino a relva macia que cobre seu túmulo, adornada por flores brancas e vermelhas, de todas as cores, como se a própria terra quisesse homenageá-la.

Em minha mente, deito-me ao lado dela, na mesma urna fria, livre enfim dos cuidados que me atormentam. Lá, não há mais dor, apenas o silêncio de um descanso eterno.

Meus olhos se enchem de lágrimas, os lábios tremem, e um soluço, vindo do fundo da alma, escapa como um grito abafado. Por um instante, sinto-a tão próxima, como se pudesse tocar sua mão, ouvir sua voz outra vez. Mas é apenas uma ilusão, um truque cruel da memória.

Volto à realidade, arrastado pela frieza do presente. Deixo a janela e sigo para minha cama, onde me espera minha única companhia verdadeira: a solidão.

Ela me abraça como uma amante fiel, sussurrando que o amanhã não será diferente. E, no entanto, há algo de estranho conforto nesse vazio. Talvez porque, na ausência de tudo, eu ainda tenha minhas lembranças - mesmo que elas sejam feitas de dor.

Francisco Silva Sousa - Foto: Pixabay

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