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quarta-feira, novembro 05, 2025

Jesus morreu para nos salvar?


 

Jesus Morreu para Nos Salvar? Uma Crítica à Doutrina da Expiação

Fiz a um crente a velha pergunta: “Por que o seu deus e não o deus dos outros?”.

A resposta veio rápida e confiante: “Deus enviou seu único filho para morrer por nós. Quer um deus melhor do que este?”.

Essa é a essência da doutrina cristã da salvação pela cruz, baseada principalmente no Evangelho de João (3:16): “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”.

Mas, ao analisar com lógica fria, a narrativa revela incoerências profundas. Vamos dissecá-la passo a passo, expandindo com analogias, contextos históricos e comparações bíblicas para destacar o absurdo.

A Analogia do Rei e dos Criminosos: Justiça ou Capricho Arbitrário?

Imaginem um rei todo-poderoso que condena um bando de criminosos à morte por seus delitos. De repente, tomado por “pena”, ele decide matar o próprio filho inocente no lugar deles e, em seguida, os liberta.

Por que sacrificar um inocente para perdoar culpados que ele mesmo condenou? Se o rei tem autoridade absoluta para perdoar (como Deus é descrito como onipotente), por que não o faz diretamente?

A morte do filho não adiciona nada à equação; parece apenas um ritual desnecessário e sádico. Na Bíblia, Deus estabelece as regras do pecado (Gênesis 2:17: “No dia em que dela comeres, certamente morrerás”) e depois as contorna com um sacrifício. Isso não é misericórdia; é burocracia divina.

Como a morte de um inocente “cancela” a culpa alheia? Não há transferência lógica de responsabilidade. Um crime não anula outro; na verdade, se os criminosos matassem o filho do rei (como a humanidade crucifica Jesus, segundo o Novo Testamento), isso somaria um novo crime à lista original.

O criminoso continua criminoso - a não ser que acreditemos em magia expiatória, onde sangue inocente apaga manchas morais. Isso ecoa sacrifícios pagãos, não justiça racional.

No caso bíblico específico, o “pecado original” vem de Adão e Eva roubando uma fruta do Éden (Gênesis 3). A punição? Morte eterna para toda a humanidade. Séculos depois, Deus envia Jesus (seu “filho unigênito”) para ser torturado e morto.

Agora, o ladrão de fruta é perdoado porque o filho do “dono do pomar” foi assassinado? É como se um juiz condenasse alguém por furtar uma maçã e, para perdoá-lo, exigisse o assassinato de seu próprio herdeiro. Onde está a proporcionalidade?

O Dilema do Pai Onipotente: Escolha Forçada ou Teatro Cósmico?

Até poderia fazer sentido um pai escolher entre salvar seu filho ou um grupo de pessoas - uma troca utilitária, onde muitas vidas valem mais que uma (como em dilemas éticos clássicos, tipo o “trem desgovernado” de Philippa Foot).

Mas aqui o pai é Deus, onipotente e onisciente. Ele poderia perdoar todos sem derramar uma gota de sangue. Por que condiciona a salvação à crucificação brutal de Jesus?

Contexto histórico dos acontecimentos: A crucificação de Jesus ocorreu por volta do ano 30-33 d.C., em Jerusalém, sob o governador romano Pôncio Pilatos.

Os Evangelhos (Mateus 27, Marcos 15, Lucas 23, João 19) descrevem um julgamento farsesco: Jesus é acusado de blasfêmia pelos líderes judeus (por se declarar Filho de Deus) e de sedição pelos romanos (por se proclamar “Rei dos Judeus”).

Ele é flagelado, coroado com espinhos, carregado com a cruz até o Gólgota e pregado entre dois ladrões. Morre após horas de agonia, com eventos “milagrosos” como escuridão no meio-dia e terremoto (possivelmente embelezamentos teológicos).

Três dias depois, a ressurreição - o “clímax” da salvação. Mas por que Deus orquestra esse espetáculo de dor? Teólogos como Anselmo de Cantuária (no Cur Deus Homo, século XI) argumentam que era necessário “satisfazer” a justiça divina ofendida pelo pecado. Resposta: se Deus define a justiça, ele poderia redefini-la sem autoflagelação.

Paulo, em Romanos 3:25, chama Jesus de “propiciação pelo seu sangue”. Isso remete diretamente a rituais do Antigo Testamento, como o Yom Kippur (Levítico 16), onde um bode carregava os pecados do povo e era sacrificado ou expelido.

Jesus seria o “Cordeiro de Deus” definitivo (João 1:29). Mas por que um Deus eterno precisa de sangue para se apaziguar? É antropomorfismo primitivo: projetamos em Deus emoções humanas como ira e necessidade de vingança.

Herança de Pecado e Lavagem Cerebral: Nascemos Culpados?

O absurdo escala quando consideramos o pecado original. Não fomos nós que comemos a fruta; foram ancestrais míticos, há supostos 6.000 anos (ou milhões, se conciliarmos com evolução). Romanos 5:12 diz: “Portanto, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porquanto todos pecaram”.

Nascemos endividados por uma dívida alheia, e a quitação exige o sacrifício de um deus encarnado. Crentes aceitam isso sem questionar, repetindo desde a infância: “Jesus morreu por seus pecados”.

Isso é lavagem cerebral clássica: doutrinação precoce inibe o raciocínio crítico. Estudos em psicologia cognitiva (como os de Daniel Kahneman sobre vieses) mostram como narrativas emocionais repetidas suprimem análise lógica. Cresças ouvindo “Deus amou tanto que deu seu Filho” e o absurdo vira verdade absoluta.

Sobrevivência de Sacrifícios Bárbaros no Século XXI

É fascinante - e perturbador - como o conceito de apaziguar deuses com sangue persiste. Povos antigos faziam isso rotineiramente:

Astecas: Sacrifícios humanos em pirâmides para alimentar o sol.

Celtas: Druidos queimavam vítimas em “homens de vime”.

Canaanitas: Oferendas a Moloch, incluindo crianças.

Até no Antigo Testamento: Abraão quase sacrifica Isaque (Gênesis 22); Jephtah cumpre voto sacrificando a filha (Juízes 11).

O cristianismo “evolui” isso: em vez de apaziguar deuses externos, Deus se auto sacrifica (como Trindade: Pai, Filho e Espírito Santo). Jesus é 100% Deus e 100% homem, então Deus morre para salvar a humanidade... dele mesmo.

É um loop teológico: Deus cria regras, quebra-as com um truque trinitário, e exige fé cega para aceitação. No século XXI, com ciência explicando origens do universo (Big Bang, evolução), neurociência mapeando crenças como padrões cerebrais, e ética secular promovendo responsabilidade individual, essa doutrina parece relíquia tribal.

Por que um deus amoroso usaria terror (ameaça de inferno eterno) para forçar adoração? Não é amor; é síndrome de Estocolmo cósmica. Em resumo, a pergunta inicial permanece: quer um deus “melhor”?

Prefiro um que perdoe sem teatro de sangue, sem heranças de culpa fictícia. A cruz não salva; expõe as contradições de uma fé que prioriza dogma sobre lógica. 

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