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sexta-feira, agosto 29, 2025

O Velho


 

Cheguei ao fim do caminho, as mãos cheias de nada, os pés feridos por espinhos, a pele enrugada pelo tempo. O peso dos anos curvou-me os ombros, e cada passo ecoa a memória de um corpo que já não responde como outrora.

As forças, outrora vibrantes, escaparam-me como areia entre os dedos, e, no vazio que deixaram, encontro apenas saudades - de quem fui, de quem amei, dos sonhos que se desfizeram como névoa ao amanhecer.

Neste mundo de cão, onde a dureza do chão machuca os pés e o coração, invento pedaços de terra firme para não sucumbir. Crio verdades frágeis, costuradas com retalhos de esperança, para dar sentido a dias que se arrastam.

Olho para dentro de mim e vejo um homem triste, moribundo, preso entre o que foi e o que resta. Sinto-me tão perto do fim, tão próximo do fundo, onde a luz mal alcança e o silêncio é rei.

Meu olhar, faminto por conexão, busca outro olhar que me enxergue, que me reconheça. Mas as pessoas passam, apressadas, cegas para o velho que carrego em mim.

Não há mais com quem dividir as palavras, os risos, as dores. Os dias, lentos como um rio que mal corre, arrastam-me em sua correnteza monótona. Por vezes, sinto que já morri antes de morrer, que a vida se esvaiu enquanto eu tentava segurá-la.

Sou velho, estou velho. Meu corpo fraqueja, minhas mãos tremem ao erguer a colher, e a comida, por vezes, escapa-me, como se até ela soubesse que já não pertenço ao ritmo dos vivos.

Mas meu coração, teimoso, ainda pulsa no peito, um tambor insistente que se recusa a silenciar. A vida passou como um vento fugaz, levando consigo os anos de luta, as noites de sonhos, os dias de trabalho sob o sol inclemente.

Vivi para sustentar os meus, para erguer paredes que hoje estão rachadas, para plantar sementes que nem sempre floresceram. Perdi amores, vi amigos partirem, carreguei lutos que pesam mais que meus próprios ossos.

E, no entanto, aqui estou. Não sou pedra, não sou muro, não sou apenas um eco do passado. Sou o futuro que envelhece, sou o espelho que reflete o que todos, um dia, serão.

Meus olhos guardam histórias que ninguém mais lê, mas minha voz, ainda que fraca, sussurra verdades que o tempo não apaga. Sou velho, estou velho, mas sou prova viva de que o coração, mesmo cansado, nunca desiste de bater.

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