Eduard Wirths: O Médico da SS e o Papel em Auschwitz
Eduard
Wirths nasceu em 4 de setembro de 1909, em Geroldshausen, na Baviera, Alemanha,
em uma família com inclinações democráticas-socialistas.
Seu
pai, um médico que serviu como oficial de saúde durante a Primeira Guerra
Mundial, exerceu forte influência sobre Eduard, que desde jovem demonstrou
traços de meticulosidade, obediência e confiabilidade - características que
marcaram sua vida adulta.
Segundo
o historiador Robert Jay Lifton, Wirths era descrito como compassivo, reservado
e "suave" em suas interações, abstendo-se de fumar ou beber. A
família Wirths não tinha histórico de antissemitismo ou simpatia pelo
nacionalismo radical, o que torna a trajetória de Eduard ainda mais paradoxal.
Apesar
de seu ambiente familiar, Wirths abraçou fervorosamente a ideologia nazista
durante seus estudos de medicina na Universidade de Würzburg (1930-1935). Em
junho de 1933, ingressou no Partido Nazista e na SA (Sturmabteilung), e, em
1934, foi admitido na SS (Schutzstaffel).
Sua
adesão ao nazismo foi reforçada por uma visão biomédica que via a
"purificação racial" como um meio de revitalizar a nação alemã. Para
Wirths, os judeus representavam uma ameaça direta à "saúde" da raça
germânica, uma crença que o alinhava aos ideais genocidas do regime.
Carreira Militar e Ascensão em Auschwitz
Em
1939, Wirths integrou a Waffen-SS e participou de combates nas frentes da
Noruega e da Rússia. Após sofrer um ataque cardíaco na primavera de 1942, foi
considerado inapto para o combate e redirecionado para o sistema de campos de
concentração.
Após
treinamento no campo de Dachau, atuou brevemente como diretor médico no campo
de Neuengamme em julho de 1942. Sua nomeação como Chefe dos Médicos da SS
(SS-Standortarzt) em Auschwitz, em setembro de 1942, marcou o início de sua
atuação central no campo, onde permaneceu até janeiro de 1945.
Como
chefe médico, Wirths era responsável por supervisionar cerca de 20 médicos da
SS, incluindo figuras infames como Josef Mengele, Horst Schumann, Carl Clauberg.
Esses médicos conduziram experimentos médicos desumanos em prisioneiros,
frequentemente resultando em sofrimento extremo ou morte.
Wirths
tinha a responsabilidade formal pelos crimes cometidos por esses subordinados,
embora ele próprio raramente participasse diretamente dos experimentos.
Papel em Auschwitz: Contradições e Crimes
Wirths
foi encarregado de combater as epidemias de tifo que assolavam tanto
prisioneiros quanto membros da SS em Auschwitz, uma tarefa na qual obteve pouco
sucesso devido às condições insalubres do campo.
Ele
também organizava as seleções de prisioneiros para experimentos médicos,
especialmente em áreas como ginecologia e combate ao tifo. Seu principal
interesse de pesquisa era o estudo de crescimentos pré-cancerosos no colo do
útero, e ele supervisionava experimentos de esterilização em mulheres,
realizados por meio de cirurgias ou radiação, delegando a execução a
subordinados como Clauberg e Schumann.
Apesar
de seu papel na máquina de extermínio, Wirths era visto por alguns
prisioneiros, especialmente médicos detidos, como relativamente
"protetor". Ele ocasionalmente intercedia para melhorar as condições
de trabalho de prisioneiros médicos, o que gerou lembranças ambivalentes.
No
entanto, essa percepção não atenua sua responsabilidade. Wirths via as mortes
em Auschwitz, incluindo as execuções nas câmaras de gás, como
"naturais", uma racionalização que refletia sua imersão na ideologia
nazista.
O
comandante de Auschwitz, Rudolf Höss, elogiou Wirths por sua eficiência
burocrática, afirmando: "Durante meus dez anos de serviço em campos de
concentração, nunca encontrei alguém melhor" (Lifton, p. 386).
Em
agosto de 1944, Wirths recomendou a promoção de um colega, descrevendo-o como
"aberto, honesto, firme, absolutamente confiável" e destacando sua
"firmeza ideológica" e contribuições para a "ciência
antropológica" - um eufemismo para os experimentos realizados com
prisioneiros.
Contexto dos Experimentos Médicos
Os
experimentos supervisionados por Wirths incluíam testes brutais, como injeções
de substâncias químicas para induzir esterilidade, exposições a radiação e
infecções deliberadas com tifo para testar vacinas.
Esses
procedimentos, realizados sem consentimento e em condições desumanas, causaram
sofrimento indizível. Por exemplo, Carl Clauberg focava em métodos de
esterilização em massa, enquanto Horst Schumann usava raios X para experimentos
de esterilização, frequentemente levando à morte das vítimas.
Josef
Mengele, sob a supervisão de Wirths, conduzia experimentos em gêmeos, buscando
avançar a pseudociência racial nazista. O irmão de Wirths, Helmut Wirths, um
ginecologista respeitado, visitou Auschwitz e participou brevemente de experimentos
relacionados ao câncer.
Horrorizado
com a natureza desumana das práticas, Helmut abandonou o campo após poucos
dias, evidenciando o contraste entre os valores familiares e as ações de
Eduard.
Fim da Guerra e Suicídio
Em
setembro de 1944,
Wirths foi promovido a SS-Sturmbannführer (major), consolidando seu status
dentro da hierarquia nazista. Com a aproximação do fim da guerra e a evacuação
de Auschwitz em janeiro de 1945, ele fugiu com outros oficiais da SS.
Capturado
pelos Aliados, foi detido sob custódia do Exército Britânico. Consciente de que
enfrentaria julgamento por crimes de guerra, Wirths cometeu suicídio por
enforcamento em 20 de setembro de 1945.
Legado e Reflexão
Eduard
Wirths personifica a contradição de um médico que, apesar de sua formação
humanitária, abraçou uma ideologia que justificava atrocidades. Sua trajetória
ilustra como a burocracia e a ideologia nazista corromperam profissionais de
saúde, transformando-os em agentes de genocídio.
Embora
nunca tenha participado diretamente dos experimentos, sua supervisão e
organização foram fundamentais para a realização dos crimes médicos em
Auschwitz.
O caso
de Wirths também levanta questões éticas sobre a responsabilidade individual em
sistemas opressivos. Sua reputação como administrador eficiente e sua ocasional
"benevolência" com prisioneiros não mitigam o impacto de suas ações.
Ele
permanece uma figura controversa, lembrada tanto por sua eficiência burocrática
quanto por sua cumplicidade nos horrores do Holocausto.
0 Comentários:
Postar um comentário