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quinta-feira, julho 18, 2024

A Criação do Universo


A criação do Universo, conforme está escrita na Bíblia, tem um jeitão meio simplista, quase como uma historinha que a gente contaria pra acalmar uma criança antes de dormir.

É tudo tão mágico, tão instantâneo: um estalar de dedos divino e, pá, surge a luz. Mais um aceno celestial e, tchã, aparecem as trevas, os mares, as montanhas, os bichos e, como o gran finale de um show de mágica, o ser humano.

É uma narrativa tão direta, tão poética, que parece até o roteiro de um desenho animado ou o número de um mágico tirando um coelho da cartola. Não é difícil entender por que essa história pegou tão forte por séculos.

Ela é redondinha, resolve tudo num passe de varinha e dá um conforto danado pra quem busca respostas prontas. Mas, quando a gente para pra pensar, fica aquele gostinho de “é só isso mesmo?”.

Eu, particularmente, me inclino mais pra ideia de que o Universo não nasceu de um truque divino, mas de um processo longo, tortuoso, cheio de idas e vindas.

Não é uma criação do nada, como se alguém tivesse ligado um interruptor cósmico, mas uma transformação lenta, bagunçada, com matéria se mexendo, se chocando, se desfazendo e virando outra coisa.

A ciência, com toda a sua confusão de hipóteses, buracos teóricos e perguntas sem resposta, me parece mais honesta do que uma explicação tão certinha.

Pensa só: o Big Bang, aquele momento em que tudo era uma sopa quente e densa, explodindo e se espalhando em todas as direções. Depois, bilhões de anos de gás e poeira se juntando pra formar estrelas, galáxias girando como discos cósmicos, planetas esfriando e, num canto qualquer, a vida surgindo aos poucos num caldo primordial.

Não tem o glamour de um “faça-se a luz”, mas tem uma lógica que conversa melhor com o que a gente observa no céu e no chão. E tem mais: o Universo não é só sobre criar, é sobre destruir também.

O caos é tão essencial quanto a ordem nessa dança cósmica. Estrelas nascem em explosões violentas e morrem em colapsos catastróficos, espalhando seus restos pra formar novos astros.

Galáxias se chocam, despedaçando sistemas inteiros pra criar outros. Aqui na Terra, os dinossauros são o exemplo perfeito disso. Sem aquele asteroide - ou o que quer que tenha varrido eles do mapa há 66 milhões de anos -, a história seria completamente diferente.

Os mamíferos, que eram só uns bichinhos miúdos tremendo nas sombras, nunca teriam tido espaço pra evoluir. A gente, que tá aqui batendo esse papo, é fruto direto de uma catástrofe.

Isso me faz pensar que o Universo é uma mistura de construção e ruptura, como se cada passo pra frente exigisse que algo fosse despedaçado antes.

Essa ideia de caos como motor da evolução é fascinante. Pensa num vulcão: ele destrói tudo ao redor, mas a lava que esfria vira solo fértil, onde a vida explode de novo.

Ou nas placas tectônicas, que se chocam, derrubam montanhas e criam outras. Até no nosso corpo, isso acontece - células morrem o tempo todo pra dar lugar a novas.

O Universo parece funcionar assim: nada é eterno, tudo se transforma, e muitas vezes essa transformação vem com uma dose generosa de bagunça. A narrativa bíblica, com sua ordem divina e criação impecável, não dá muito espaço pra esse vaivém.

É como se Deus tivesse desenhado tudo com régua e compasso, sem deixar margem pro erro ou pro imprevisto. Mas o mundo real, com suas cicatrizes cósmicas e terrestres, conta uma história bem mais desajeitada - e, pra mim, mais interessante.

Outra coisa que me pega é como a ciência abraça o mistério, enquanto a narrativa bíblica parece querer eliminá-lo. A ciência não tem vergonha de dizer “não sei”. O Big Bang? A gente tem uma ideia do que aconteceu, mas o que veio antes, se é que tinha um “antes”, é um baita ponto de interrogação.

A vida? Sabemos que ela surgiu, mas o exato momento em que uma sopa química virou algo que pulsa e se reproduz ainda é um enigma. A Bíblia, por outro lado, com toda a certeza que carrega, oferece um conforto pra quem prefere respostas definitivas.

Só que, pra mim, esse conforto vem com um preço: ele fecha a porta pro assombro, praquele frio na espinha que dá quando a gente encara o tamanho do desconhecido.

E tem mais um ponto que acho que enriquece essa reflexão: o tempo. Na Bíblia, tudo acontece em seis dias, como se o Universo pudesse ser montado numa semana de trabalho.

Mas o tempo cósmico é outra história. São 13,8 bilhões de anos desde o Big Bang, com eventos que demoram eras pra se desenrolar. Estrelas levam milhões de anos pra nascer e morrer.

A Terra levou bilhões de anos pra esfriar, formar oceanos e abrigar vida. Até a evolução humana, que parece rapidinha perto disso tudo, levou milhões de anos de tentativa e erro.

Esse tempo profundo, essa paciência do Universo, é algo que a narrativa bíblica não captura. Ela é apressada, quer tudo pronto logo. Mas o Universo real é mais como um artesão teimoso, que refaz a obra mil vezes até acertar - ou até decidir que o “acerto” é só uma etapa pra próxima ruptura.

No fim, acho que o pulo do gato tá aí: a ideia de criar algo do nada é bonita na poesia, mas não cola com o que a gente vê no mundo. Tudo vem de algum lugar.

A semente vira árvore, o rio corta a pedra, o pó estelar vira planeta, e até a gente veio de uma longa cadeia de acasos, catástrofes e transformações. A ciência não explica tudo, e às vezes tropeça feio, mas pelo menos ela tem a coragem de encarar o caos e dizer: “tá, isso aqui é uma bagunça, mas vamos tentar entender”.

Eu prefiro essa honestidade, mesmo que ela venha com mais perguntas do que respostas. E, no fundo, acho que o mistério é o que faz essa história toda valer a pena. É ele que nos faz olhar pro céu e pensar: “caramba, como é que a gente chegou aqui?”.

E você, o que acha dessa bagunça cósmica toda? Acha que o caos e a destruição são mesmo o tempero que dá graça à evolução, ou prefere uma história mais arrumadinha, como a da Bíblia?

 Francisco Silva Sousa - Foto: Pixabay             

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