Propaganda

sábado, julho 27, 2024

Laika a Cadela Espacial - Sacrificada em experiências de humanos




Laika, a Cadela Espacial: Um Sacrifício em Nome da Ciência

Laika, uma pequena vira-lata que provavelmente nasceu em 1954 nas ruas de Moscou, tornou-se um marco na história da exploração espacial ao ser o primeiro animal a orbitar a Terra.

Selecionada para a missão soviética Sputnik 2, lançada em 3 de novembro de 1957, Laika não foi apenas um passageiro improvável, mas também um símbolo da ambição humana e dos dilemas éticos da corrida espacial.

Sua história, marcada por coragem, sacrifício e controvérsia, continua a ecoar como um lembrete dos custos da conquista científica.

A Escolha de Laika

Laika, cujo nome significa "latidora" em russo e remete a raças de cães semelhantes ao husky, era uma fêmea de aproximadamente três anos e cerca de cinco a seis quilos.

Encontrada vagando pelas ruas de Moscou, ela foi escolhida por cientistas soviéticos devido à sua resistência, presumida por sua sobrevivência nas duras condições urbanas de frio e fome.

A escolha de cães de rua, como Laika, Albina e Mushka, refletia a crença de que esses animais eram mais aptos a suportar os rigores do treinamento e do voo espacial. Laika, descrita como calma e afetuosa, conquistou os corações de seus treinadores, apesar do destino trágico que a aguardava.

Os cientistas Vladimir Yazdovsky e Oleg Gazenko, especialistas em medicina espacial, conduziram o treinamento. Para preparar Laika para a apertada cabine do Sputnik 2, ela foi submetida a longos períodos em gaiolas cada vez menores, por até 20 dias, o que causou estresse físico e psicológico, incluindo recusa em comer e defecar.

Centrífugas simularam a aceleração do lançamento, enquanto máquinas reproduziam os ruídos da nave, dobrando sua frequência cardíaca e elevando sua pressão arterial. Laika também foi treinada para consumir um gel nutritivo, sua única fonte de alimento no espaço.

Antes do lançamento, Yazdovsky levou Laika para casa, onde ela brincou com seus filhos. Ele mais tarde escreveu: "Laika era quieta e encantadora [...] eu queria fazer algo de bom para ela: ela tinha tão pouco tempo de vida." Esse gesto humano contrasta com a decisão científica de enviar Laika em uma missão sem retorno.

A Missão Sputnik 2

O lançamento do Sputnik 2 foi impulsionado pela pressão política do líder soviético Nikita Khrushchev, que, após o sucesso do Sputnik 1 em outubro de 1957, exigiu um novo feito para o 40º aniversário da Revolução de Outubro, em 7 de novembro.

Com um satélite mais avançado (futuro Sputnik 3) ainda em construção, os engenheiros soviéticos, com menos de quatro semanas, projetaram o Sputnik 2 às pressas, utilizando esboços rudimentares.

A missão, concebida como um "espetáculo espacial", visava demonstrar que um ser vivo poderia sobreviver ao lançamento e à microgravidade, pavimentando o caminho para voos humanos.

A nave foi equipada com um sistema de suporte à vida, incluindo um gerador de oxigênio, dispositivos para absorver dióxido de carbono e um ventilador ativado a 15 ºC.

Laika, restrita por um arnês que limitava seus movimentos a sentar, ficar em pé ou deitar, foi monitorada por sensores que mediam frequência cardíaca, respiração e pressão arterial. A cabine, pequena e sem espaço para manobras, continha comida em forma de gel para sete dias e uma bolsa para resíduos.

O Lançamento e o Sacrifício

No dia 31 de outubro de 1957, Laika foi colocada na cápsula em condições de frio extremo no Cosmódromo de Baikonur. Uma mangueira conectada a um aquecedor mantinha a cabine aquecida, e dois assistentes monitoravam a cadela constantemente.

Antes do fechamento da escotilha, técnicos limparam seu pelo com etanol, aplicaram iodo nos pontos de sensores e, em um gesto comovente, beijaram seu nariz, desejando-lhe boa sorte, sabendo que ela não voltaria.

O lançamento ocorreu na manhã de 3 de novembro, entre 5h30 e 7h22, horário de Moscou. Durante a aceleração, a frequência cardíaca de Laika saltou de 103 para 240 batimentos por minuto, e sua respiração quadruplicou.

Em órbita, uma falha crítica ocorreu: o núcleo do foguete R-7 (Bloco A) não se separou, comprometendo o sistema de controle térmico. Parte do isolamento térmico se soltou, elevando a temperatura da cabine a 40 ºC.

Após três horas, os sinais indicavam que Laika estava agitada, mas se alimentava. Entre cinco e sete horas após o lançamento, os sinais vitais cessaram.

Em 2002, revelou-se que Laika morreu de superaquecimento e estresse, provavelmente na quarta órbita, e não por asfixia ou eutanásia, como alegado inicialmente pelo governo soviético.

O Sputnik 2 orbitou por mais de cinco meses, completando 2.570 órbitas, até se desintegrar na reentrada atmosférica em 14 de abril de 1958, com os restos de Laika.

O Contexto da Corrida Espacial

A missão de Laika ocorreu no auge da Guerra Fria, quando Estados Unidos e União Soviética competiam pela supremacia tecnológica. O sucesso do Sputnik 1 havia abalado o Ocidente, e o Sputnik 2, com Laika, reforçou a liderança soviética.

Contudo, a pressa para cumprir o prazo de Khrushchev resultou em uma missão mal planejada, sem tecnologia para retorno seguro. Desde 1951, os soviéticos realizavam voos suborbitais com cães, mas a missão orbital de Laika foi um salto ambicioso, projetado para coletar dados sobre radiação solar, raios cósmicos e os efeitos da microgravidade em organismos vivos.

A morte de Laika, embora prevista, foi ocultada por décadas. A narrativa oficial soviética sugeria que ela sobreviveu por dias, morrendo por falta de oxigênio ou eutanásia.

A verdade, revelada apenas em 2002 por Dimitri Malashenkov, expôs as limitações técnicas e a pressão política que comprometeram a missão.

Impacto Ético e Cultural

A missão de Laika desencadeou um debate global sobre ética em experimentos com animais. No Reino Unido, a Liga Nacional de Defesa Canina pediu um minuto de silêncio, e a RSPCA recebeu protestos antes mesmo do anúncio oficial do lançamento.

Nos Estados Unidos, manifestações ocorreram em frente às Nações Unidas, enquanto grupos de direitos dos animais usaram a missão para criticar testes científicos. Contudo, na União Soviética, a censura limitou o debate público, e a morte de Laika foi aceita como um sacrifício necessário.

Em 1998, Oleg Gazenko expressou remorso: "Quanto mais o tempo passa, mais sinto muito. Não aprendemos o suficiente desta missão para justificar a morte da cadela."

Críticas também surgiram em países aliados, como na Polônia, onde o cientista Krzysztof Boruń lamentou a perda científica e ética da missão. Culturalmente, Laika tornou-se um ícone. Monumentos foram erguidos em sua homenagem, como a estátua de 2008 perto do centro de pesquisa militar em Moscou e sua representação no Monumento aos Conquistadores do Cosmos (1964).

Selos postais, marcas de chocolate, charutos e souvenirs celebram sua memória. Na cultura popular, Laika inspirou obras como o romance gráfico de Nick Abadzis (2007), premiado com o Eisner, a música "Neighborhood #2 (Laika)" do Arcade Fire (2004) e o filme animado checo Lajka (2017).

Legado de Laika

Laika pavimentou o caminho para missões humanas, como o voo de Yuri Gagarin em 1961. Após sua missão, a União Soviética enviou mais 12 cães ao espaço, cinco dos quais retornaram vivos, em missões projetadas para recuperação.

No entanto, outros quatro cães morreram em falhas subsequentes, como a explosão do foguete de Bars e Lisichka (1960) e a destruição intencional do Korabl-Sputnik 3 com Pchvolka e Mushka (1960).

A história de Laika é um lembrete agridoce do custo do progresso científico. Sua coragem involuntária e o sacrifício final abriram portas para a exploração espacial, mas também levantaram questões éticas que ainda ressoam.

Como disse Gazenko, o sofrimento dos animais em experimentos é uma fonte de reflexão para a humanidade, que busca equilíbrio entre a busca pelo conhecimento e o respeito pela vida.



 

0 Comentários: