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quarta-feira, agosto 20, 2025

Na Supressão da Liberdade, o Livro é a Primeira Vítima


 

Em regimes que suprimem a liberdade, a intolerância à expressão e à oposição é uma marca definidora. A história demonstra que, onde a democracia é sufocada e métodos totalitários prevalecem, o controle da opinião começa pela censura e destruição de ideias.

Livros, músicas, peças de teatro e outras formas de arte tornam-se alvos imediatos, pois representam a liberdade de pensamento e o potencial de questionar a autoridade. Como disse George Orwell em sua obra profética 1984, o controle do conhecimento é a base do poder totalitário.

A supressão cultural, portanto, é não apenas um ato de repressão, mas uma estratégia para infantilizar a sociedade e consolidar o domínio estatal.

O Ataque à Cultura como Estratégia de Controle

A censura cultural é uma prática antiga, mas ganhou contornos sistemáticos em regimes totalitários. Livros, por sua capacidade de disseminar ideias e preservar o conhecimento, são frequentemente as primeiras vítimas.

A indexação - a criação de listas de obras proibidas - e a queima de livros são símbolos históricos desse ataque à liberdade. Durante a Inquisição, a Igreja Católica mantinha o Index Librorum Prohibitorum, uma lista de livros considerados heréticos ou moralmente perigosos, que vigorou do século XVI até 1966. Obras de pensadores como Galileu Galilei e Voltaire foram banidas por desafiar dogmas religiosos ou políticos.

No século XX, regimes totalitários intensificaram essas práticas. Na Alemanha nazista, em 1933, as queimas de livros promovidas por estudantes e apoiadores do regime destruíram milhares de obras consideradas “degeneradas” ou contrárias à ideologia nazista.

Autores como Karl Marx, Sigmund Freud, Thomas Mann e Erich Maria Remarque tiveram seus livros queimados em praças públicas, enquanto artistas e intelectuais eram perseguidos, exilados ou mortos.

Da mesma forma, na União Soviética stalinista, livros que não se alinhavam à ideologia comunista eram confiscados, e escritores como Aleksandr Soljenítsin enfrentaram prisão ou exílio por suas críticas ao regime. Além dos livros, outras formas de expressão, como músicas e peças de teatro, também são alvos.

Durante a ditadura militar no Brasil (1964-1985), canções de artistas como Chico Buarque e Caetano Veloso foram censuradas por suas mensagens políticas, e muitos músicos foram exilados. Peças teatrais, como as do grupo Teatro Oficina, eram proibidas ou monitoradas por desafiar o status quo.

A arte visual também sofre: no nazismo, obras modernistas de artistas como Pablo Picasso e Wassily Kandinsky foram retiradas de museus, rotuladas como “arte degenerada” e, em alguns casos, destruídas.

O Controle na Era da Sociedade de Massas

Na sociedade contemporânea, o controle da expressão vai além dos livros e da arte tradicional, alcançando os meios de comunicação de massa, como televisão, rádio e, mais recentemente, a internet.

Regimes autoritários modernos utilizam tecnologias para monitorar e restringir o fluxo de informações. Na China, por exemplo, o “Grande Firewall” bloqueia sites e conteúdos considerados subversivos, enquanto sistemas de vigilância digital rastreiam postagens em redes sociais.

Durante o regime de apartheid na África do Sul (1948-1994), programas de rádio e televisão eram rigidamente controlados para promover a narrativa do governo e suprimir vozes dissidentes.

A internet, embora inicialmente vista como um espaço de liberdade, tornou-se um campo de batalha pela informação. Em países como a Turquia e a Rússia, governos impõem bloqueios a plataformas digitais e perseguem jornalistas e blogueiros que criticam o poder.

Mesmo em democracias, a disseminação de desinformação e a pressão de grupos ideológicos podem levar à autocensura, onde indivíduos evitam expressar opiniões por medo de represálias.

Essa vigilância generalizada reduz a sociedade a um estado de dependência e infantilização. O Estado, ao assumir o papel de “supervisor”, trata os cidadãos como incapazes de discernir por si mesmos, justificando a censura sob o pretexto de proteger a ordem ou a moral.

Essa dinâmica é central em 1984 de George Orwell, onde o Partido controla a história, a linguagem (por meio da “novilíngua”) e até o pensamento, eliminando qualquer possibilidade de dissidência.

A Relevância de 1984 e Outras Obras

George Orwell, em 1984, publicado em 1949, oferece uma visão assustadoramente precisa dos mecanismos de controle totalitário. No romance, o protagonista Winston Smith vive em um mundo onde o “Grande Irmão” monitora cada aspecto da vida, e o Ministério da Verdade reescreve a história para alinhá-la aos interesses do Partido.

Livros, jornais e registros são constantemente alterados, apagando evidências de verdades inconvenientes. A manipulação da linguagem, como a redução do vocabulário para limitar o pensamento crítico, reflete a tentativa de regimes reais de controlar não apenas o que as pessoas dizem, mas o que podem imaginar.

Outras obras literárias também exploram a supressão da liberdade. Em Fahrenheit 451 (1953), de Ray Bradbury, bombeiros queimam livros para manter uma sociedade conformista, onde o pensamento crítico é desencorajado.

Já O Conto da Aia (1985), de Margaret Atwood, retrata um regime teocrático que proíbe mulheres de ler e escrever, consolidando o controle patriarcal. Essas obras reforçam a ideia de que a destruição do conhecimento é uma ferramenta de opressão, mas também destacam a resiliência das ideias, que persistem mesmo sob repressão.

Exemplos Históricos e Contemporâneos

Além dos casos já mencionados, a supressão cultural tem raízes em diversas épocas e contextos. Durante a Revolução Cultural na China (1966-1976), liderada por Mao Tsé-Tung, livros, obras de arte e monumentos históricos foram destruídos em nome da “purificação” ideológica.

Intelectuais foram humilhados, presos ou mortos, e bibliotecas inteiras foram devastadas. No Irã, após a Revolução Islâmica de 1979, livros e filmes considerados contrários aos valores islâmicos foram banidos, e artistas enfrentaram censura rigorosa.

No século XXI, a censura continua em formas mais sutis ou tecnológicas. Em 2020, a Arábia Saudita foi criticada por restringir conteúdo online que desafiavam a monarquia, enquanto na Coreia do Norte, o acesso à informação externa é praticamente inexistente, com a mídia estatal controlando todas as narrativas.

Mesmo em democracias, movimentos de censura surgem sob o pretexto de combater “fake news” ou proteger sensibilidades culturais, levantando debates sobre os limites da liberdade de expressão.

O Crime de Opinião e a Resistência

A ideia de “crime de opinião”, é uma aberração nas democracias, onde constituições modernas protegem a liberdade de expressão como um direito fundamental. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e constituições como a do Brasil (1988) condenam qualquer tentativa de punir indivíduos por suas ideias ou crenças.

No entanto, regimes autoritários frequentemente criminalizam opiniões dissidentes, usando leis vagas para silenciar críticos. Na Turquia, por exemplo, jornalistas têm sido presos sob acusações de “insultar a nação” ou “propaganda terrorista”.

Apesar da repressão, a história também é marcada por atos de resistência. Escritores como Salman Rushdie, cuja obra Os Versos Satânicos (1988) gerou ameaças de morte, e dissidentes como Liu Xiaobo, Nobel da Paz em 2010, enfrentaram a censura com coragem.

Bibliotecas clandestinas, como as criadas na Polônia durante a ocupação nazista, e plataformas digitais que driblam a censura, como blogs anônimos em países autoritários, mostram que o desejo de expressão é irreprimível.

A supressão da liberdade começa com o ataque à cultura - livros, músicas, artes - porque essas são as vozes do pensamento livre. Como primeira vítima, o livro simboliza a luta pela autonomia intelectual e a resistência contra a opressão.

De Orwell a Bradbury, a literatura nos alerta para os perigos de um mundo onde a verdade é manipulada e o pensamento, controlado. Em um tempo de vigilância digital e polarização, a defesa da liberdade de expressão é mais crucial do que nunca.

Proteger o direito de criar, ler e questionar é garantir que a sociedade não seja reduzida à infantilização, mas elevada pela força das ideias.

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