Quando
perguntado sobre a essência das sociedades fracassadas, o escritor russo Anton
Tchékhov teria dito:
“Em
sociedades decadentes, para cada mente lúcida, há mil vozes tolas a gritar.
Para cada palavra pensada, mil frases vazias ecoam sem propósito. O banal toma
o centro do palco, e o senso comum se afoga num mar de trivialidades.
Quando
debates se reduzem a futilidades e os medíocres ocupam o protagonismo, não há
dúvida: estás diante de uma sociedade em ruínas. Milhões dançam e celebram ao
som de palavras ocas, e o autor dessas banalidades é elevado a ídolo - amado,
ovacionado, intocável.
Enquanto
isso, os pensadores, aqueles que ousam questionar, refletir e despertar, são
ignorados, silenciados ou relegados às margens, como vozes incômodas que
perturbam o silêncio confortável da multidão.
As
massas preferem o riso fácil à reflexão árdua, o entorpecimento à lucidez, o
ilusionista ao mensageiro. Quem diverte é exaltado; quem alerta, rejeitado.
Assim, numa sociedade que idolatra o vazio e foge da verdade, a democracia
torna-se uma arma perigosa - pois o destino é entregue a uma maioria que teme
pensar.”
Essa
visão, atribuída a Tchékhov, ressoa com uma atualidade inquietante. Em um mundo
saturado por redes sociais, a superficialidade muitas vezes prevalece.
Discussões
políticas e sociais, que deveriam ser arenas de ideias robustas, frequentemente
se dissolvem em slogans, memes e frases de efeito. Líderes carismáticos, que
dominam a arte do espetáculo, conquistam multidões com promessas simplistas,
enquanto vozes que propõem reflexões complexas ou alertam para crises iminentes
- sejam climáticas, econômicas ou culturais - lutam para serem ouvidas.
Considere,
por exemplo, o fenômeno das “fake news” e da desinformação, que se espalham
como fogo em palha seca. Em 2020, durante a pandemia de Covid-19, teorias
conspiratórias sobre vacinas ou tratamentos ineficazes ganharam tração global,
muitas vezes amplificadas por figuras públicas que priorizavam atenção
midiática sobre fatos científicos.
Enquanto
isso, cientistas e especialistas enfrentavam ataques ou descrédito, suas vozes
abafadas pelo clamor de narrativas sensacionalistas. Outro exemplo é a
polarização política, que transforma debates em espetáculos de torcida.
Em
muitos países, eleitores se dividem em bolhas ideológicas, guiados menos por
argumentos racionais e mais por lealdades emocionais a líderes ou causas.
Nesse
cenário, a democracia, que depende do discernimento coletivo, é fragilizada
quando a maioria prefere a validação instantânea à análise crítica. Tchékhov,
com sua pena afiada, talvez visse nesses acontecimentos a confirmação de sua
análise.
A
sociedade moderna, obcecada por distrações e avessa ao desconforto do
pensamento profundo, arrisca sua própria ruína ao celebrar o efêmero e ignorar
o essencial.
Contudo, há esperança: a lucidez, ainda que minoritária, persiste. Cabe às mentes críticas resistir ao vazio, insistir na reflexão e reacender o debate com ideias que iluminem, em vez de ofuscar.
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