Os criadores de leis parecem encontrar um prazer perverso em sua missão. Projetam normas, regulamentos, códigos e estatutos com palavras polidas e promessas de justiça, mas, por trás das portas fechadas, é no ato de violá-las que verdadeiramente se deleitam.
Reúnem-se em sessões opulentas, adornadas por tapetes
vermelhos e jantares faustosos, onde o erário público escorre pelo ralo da
vaidade e do desperdício.
No
púlpito, travam batalhas retóricas, acusam-se mutuamente, trocam farpas e
ofensas, como gladiadores de uma arena moral falida. Mas essas encenações,
muitas vezes, não passam de cortinas de fumaça.
Por trás dos discursos inflamados, articulam acordos
obscuros, legislam para si mesmos, empilham privilégios e reforçam os muros que
os separam do povo. O bem comum é tratado como um detalhe inconveniente, um
peso morto a ser arrastado apenas quando convém à própria imagem.
São
como crianças brincando na praia, erguendo castelos de areia com gestos
solenes, fingindo uma importância que não sustenta o sopro da maré. Sabem que,
ao menor descuido - ou à menor denúncia -, tudo ruirá.
E mesmo assim, riem. Riem do colapso de suas obras,
como se a ruína fosse apenas parte do jogo. Investem montes de areia -
promessas, discursos, emendas e decretos - enquanto o mar, impassível, se
encarrega de devolver-lhes o que não tem solidez. Uma dança fútil entre vaidade
e efemeridade.
E assim
seguem, entre risos e ondas, alheios à gravidade de suas funções. A natureza,
sábia e implacável, zomba dos fracos, mas reserva desprezo especial àqueles que
se curvam diante da ganância e se alimentam do egoísmo.
Os legisladores, por sua vez, riem do povo, como se a
confiança neles depositada fosse apenas mais um punhado de areia a ser moldado,
manipulado e descartado.
Constroem
leis frágeis como brinquedos de criança, que desmoronam diante das marés da
realidade: corrupção sistêmica, desigualdade crescente, crises sucessivas na
educação, na saúde, na segurança.
E mesmo assim continuam a brincar, protegidos por seus
salários astronômicos, por seus carros oficiais, por suas verbas de gabinete,
por seus seguranças e imunidades parlamentares - escudos que os isolam das
consequências das tempestades que ajudam a gerar.
Nos
acontecimentos recentes, vemos o espelho dessa farsa: escândalos de corrupção
que explodem com a frequência de tempestades tropicais; CPIs que nascem e
morrem sem resultados; delações arquivadas; investigações soterradas pela
burocracia.
Enquanto isso, a fome volta aos rostos magros das
periferias, o abandono escolar assombra uma geração inteira, e hospitais
sucateados se tornam retratos do colapso institucional. Em vez de soluções, o
povo recebe discursos decorados, votos secretos, manobras regimentais.
Nas
ruas, os gritos de indignação ecoam. Movimentos populares se erguem, protestos
ganham corpo, vozes clamam por dignidade. Mas, nas câmaras e assembleias, o som
que predomina ainda é o das risadas abafadas daqueles que se julgam intocáveis.
A indiferença institucionaliza-se. A esperança, por vezes, parece escassa.
Mas nem
tudo se desfaz com o vento. Em momentos decisivos, o povo desperta. Como um mar
revolto, levanta-se em ondas que arrebentam castelos, que derrubam tronos.
Greves, manifestações, ocupações, denúncias, votos
conscientes - pequenas revoluções cotidianas que lembram aos legisladores que a
história não é escrita apenas por aqueles que têm a caneta nas mãos, mas por
quem resiste com coragem e memória.
A
verdadeira força não está nos palácios, mas na união dos que, mesmo exaustos,
não desistem. Porque há sempre um momento em que a maré muda, e quando isso
acontece, nenhuma muralha de privilégios é capaz de conter a fúria daqueles que
foram traídos.
Que os legisladores não se esqueçam: o tempo cobra caro daqueles que constroem sobre a areia da mentira e da omissão. Enquanto eles riem, a história observa. E ela, implacável, não perdoa os que brincam com o que é sagrado - a confiança de uma nação. O mar, um dia, virá.
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