Auschwitz I: O Campo Central do Horror Nazista
Auschwitz
I, localizado em Oświęcim, na Polônia ocupada, foi o campo de concentração
original e o coração administrativo do complexo de Auschwitz, um dos maiores
símbolos do Holocausto.
Construído
em 1940, o local originalmente abrigava quartéis de artilharia do exército
polonês, compostos por 16 edifícios térreos de alvenaria. Com o avanço da
repressão nazista e a superlotação de outros campos, a SS (Schutzstaffel)
buscava um novo espaço para internar prisioneiros.
O Obergruppenfuhrer
Erich von dem Bach-Zelewski, líder da polícia da Silésia, identificou o
potencial da área. Richard Glücks, chefe da Inspetoria dos Campos de
Concentração, enviou Walter Eisfeld, ex-comandante de Sachsenhausen, para
avaliar o local.
Após a
aprovação, Heinrich Himmler, líder da SS, ordenou a construção do campo, que
foi supervisionada por Rudolf Höss, seu primeiro comandante, com Josef Kramer
como subcomandante.
Expulsão e Preparação do Terreno
Para
viabilizar o projeto, a SS despejou cerca de 1.200 moradores locais que viviam
em barracas próximas aos quartéis, criando uma "área de interesse" de
40 km² ao redor do campo.
Entre
1940 e 1941, aproximadamente 17 mil poloneses e judeus dos distritos ocidentais
de Oświęcim e vilas próximas, como Broszkowice, Babice, Brzezinka, Rajsko, Plawy,
Harmeze, Bór e Budy, foram forçados a abandonar suas casas.
Essas
expulsões visavam estabelecer uma Zona de Exclusão, isolando o campo do mundo
exterior e facilitando as operações genocidas da SS. Muitas das residências
vagas foram ocupadas por alemães étnicos (Volksdeutsche) trazidos de fora do
Reich, enquanto os judeus despejados eram enviados para guetos superlotados.
Cerca
de 300 judeus de Oświęcim foram requisitados para trabalhar nas fundações do
campo, sob condições brutais. A construção foi marcada por violência e
exploração, com os trabalhadores submetidos a longas jornadas, alimentação
insuficiente e abusos constantes.
Primeiros Prisioneiros e Expansão
Em maio
de 1940, os primeiros prisioneiros chegaram: 30 criminosos alemães transferidos
de Sachsenhausen, designados para atuar como kapos - supervisores privilegiados
que controlavam outros internos em troca de benefícios.
Em 14
de junho de 1940, o primeiro transporte em massa, composto por 728 prisioneiros
poloneses (incluindo 20 judeus), chegou da prisão de Tarnów. Esses
prisioneiros, em sua maioria dissidentes, intelectuais e membros da resistência
polonesa, foram alojados temporariamente no edifício da antiga Polish Tobacco
Monopoly, até que o campo estivesse concluído.
A
população de Auschwitz I cresceu rapidamente. Em março de 1941, o campo já
abrigava 10,9 mil prisioneiros, majoritariamente poloneses. A partir de 1941,
prisioneiros de guerra soviéticos começaram a chegar, enfrentando condições
ainda mais desumanas.
Dos
primeiros 10 mil soldados soviéticos internados, apenas algumas centenas
sobreviveram aos primeiros cinco meses, devido à fome, doenças e execuções
sumárias.
Organização e Condições de Vida
Os
prisioneiros eram divididos por categorias, identificadas por triângulos
coloridos costurados em suas roupas: verde para criminosos comuns, vermelho
para presos políticos, amarelo para judeus e preto para "associação"
(como ciganos ou testemunhas de Jeová).
Judeus
e prisioneiros soviéticos eram sistematicamente tratados com maior crueldade,
enfrentando abusos constantes e taxas de mortalidade extremamente altas.
Todos
os prisioneiros eram obrigados a realizar trabalhos forçados, principalmente em
fábricas de armamentos associadas ao complexo, como a IG Farben.
As
condições de trabalho eram exaustivas, com jornadas de 12 a 14 horas,
alimentação escassa (geralmente sopa aguada e um pedaço de pão) e falta de
higiene, o que resultava em doenças como tifo e disenteria.
Aos
domingos, o trabalho era suspenso, mas os prisioneiros eram submetidos a longas
sessões de limpeza e inspeção, frequentemente acompanhadas de violência.
Os
kapos, muitas vezes criminosos alemães, desempenhavam um papel ambíguo. Embora
alguns tenham cometido atrocidades, outros agiam sob coação, temendo perder
seus privilégios ou serem mortos. No pós-guerra, apenas dois kapos de Auschwitz
foram julgados por seus atos individuais, refletindo a complexidade de sua
posição no sistema.
O Bloco 11: O Epicentro da Crueldade
O Bloco
11, conhecido como "a prisão dentro da prisão", era reservado para
punições severas. Prisioneiros acusados de quebrar regras, tentar fugas ou
sabotagem enfrentavam torturas brutais.
As
"celas verticais", com apenas 1,5 m², confinavam quatro pessoas
simultaneamente, forçando-as a permanecer em pé durante noites seguidas antes
de retornar ao trabalho forçado.
No
porão, as "celas da fome" condenavam os internos à morte por
inanição, enquanto as "celas escuras", com ventilação mínima e portas
sólidas, causavam sufocamento gradual. Guardas da SS frequentemente aceleravam
o processo acendendo velas para consumir o oxigênio mais rapidamente.
Outra
forma de tortura era a suspensão prolongada, com os prisioneiros pendurados
pelas mãos amarradas às costas, o que frequentemente resultava em deslocamento
das clavículas e danos permanentes.
Essas
punições não tinham apenas o objetivo de disciplinar, mas também de desumanizar
e aterrorizar a população do campo.
O Primeiro Uso do Zyklon-B
Em 3 de
setembro de 1941, o subcomandante Karl Fritzsch conduziu um experimento macabro
no Bloco 11: 600 prisioneiros de guerra soviéticos e 150 poloneses foram
trancados em um porão e gaseificados com Zyklon-B, um pesticida à base de
cianeto.
O teste
foi considerado "bem-sucedido" pela SS, marcando o início do uso
sistemático do gás como método de extermínio em massa. Esse evento foi um
precursor das câmaras de gás em Auschwitz-Birkenau, onde milhões seriam
assassinados.
Experimentos Médicos e Outras Atrocidades
Além
das execuções, Auschwitz I foi palco de experimentos médicos desumanos
conduzidos por médicos da SS, como Josef Mengele (que operava principalmente em
Birkenau, mas também influenciava Auschwitz I).
Prisioneiros,
especialmente judeus e ciganos, eram submetidos a testes de esterilização,
infecções deliberadas e cirurgias sem anestesia, sob o pretexto de
"pesquisa científica". Esses experimentos causaram sofrimento
indizível e altas taxas de mortalidade.
Resistência e Humanidade em Meio ao Horror
Apesar
das condições desumanas, pequenos atos de resistência ocorriam. Prisioneiros
poloneses, em particular, formaram redes clandestinas para contrabandear
informações, alimentos e medicamentos.
Alguns,
como Witold Pilecki, entraram voluntariamente em Auschwitz para documentar as
atrocidades e organizar a resistência interna. Essas ações, embora arriscadas,
demonstravam a resiliência humana em face do terror.
Legado de Auschwitz I
Auschwitz
I foi o ponto de partida para o genocídio sistemático que se expandiu em
Auschwitz-Birkenau e Monowitz. Estima-se que cerca de 70 mil pessoas,
principalmente poloneses e prisioneiros soviéticos, morreram em Auschwitz I,
embora o número total de vítimas do complexo (incluindo Birkenau) ultrapasse
1,1 milhão, a maioria judeus.
Após a
libertação pelo Exército Vermelho em 27 de janeiro de 1945, Auschwitz tornou-se
um símbolo universal do Holocausto e da capacidade humana para a crueldade.
Hoje, o campo é um museu e memorial, preservando a memória das vítimas e
servindo como alerta contra o ódio e a intolerância.