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terça-feira, outubro 21, 2025

A Linguagem dos Primatas


 

A Linguagem dos Primatas: Avanços, Limites e o Mistério das Perguntas Não Feitas

Desde a década de 1960, cientistas têm explorado a capacidade de grandes primatas de utilizar formas de comunicação complexas, como a linguagem de sinais.

Um marco histórico ocorreu em 1966, quando a chimpanzé Washoe se tornou o primeiro primata não humano a aprender a Língua de Sinais Americana (ASL, na sigla em inglês).

Sob a tutela dos pesquisadores Allen e Beatrix Gardner, Washoe adquiriu um vocabulário de aproximadamente 350 sinais, usando-os para expressar necessidades, emoções e até conceitos abstratos, como "amor" e "tempo".

Esse feito revolucionou as percepções sobre a inteligência animal e abriu caminho para estudos subsequentes. Em 1972, a gorila Koko, treinada pela psicóloga Penny Patterson, alcançou fama mundial ao dominar mais de 1.000 sinais da ASL e demonstrar compreensão de cerca de 2.000 palavras faladas em inglês.

Koko não apenas se comunicava de forma funcional, mas também expressava emoções complexas, como tristeza pela perda de seu filhote, o gatinho All Ball, em 1984. Sua habilidade de combinar sinais para criar novas expressões, como "anjo de água" para descrever um peixe, sugeriu um nível de criatividade linguística antes considerado exclusivo dos humanos.

Outro caso notável é o do bonobo Kanzi, que, a partir de 1980, sob a orientação da pesquisadora Sue Savage-Rumbaugh, demonstrou habilidades ainda mais impressionantes.

Kanzi aprendeu a usar um painel de lexigramas - um conjunto de 400 símbolos gráficos que representam palavras ou conceitos - para se comunicar.

Ele reconhecia cerca de 3.000 palavras em inglês e era capaz de formar frases simples, respondendo a comandos complexos, como "pegue a bola que está na geladeira".

Diferentemente de Washoe e Koko, Kanzi adquiriu grande parte de seu vocabulário de maneira espontânea, observando as interações de sua mãe adotiva, Matata, durante os experimentos.

Apesar desses avanços notáveis, um aspecto intrigante emergiu ao longo das décadas de pesquisa, entre 1966 e 2000: nenhum desses primatas demonstrou a capacidade de fazer perguntas espontâneas.

Em milhares de interações registradas, os pesquisadores observaram pedidos (como "dá comida"), respostas a comandos e até expressões de sentimentos, mas nunca questionamentos claros, como “quem?”, “onde?” ou “por quê?”.

Essa ausência de perguntas espontâneas destacou uma possível barreira cognitiva fundamental entre a comunicação primata e a linguagem humana. Esse fenômeno desencadeou debates intensos na comunidade científica sobre os limites da cognição animal.

Enquanto humanos usam a linguagem para explorar o desconhecido, formular hipóteses e questionar a realidade, os grandes primatas parecem limitar-se a comunicações voltadas para o presente imediato ou para expressar necessidades e emoções.

Alguns estudiosos, como o linguista Noam Chomsky, argumentam que a capacidade de fazer perguntas reflete uma habilidade exclusivamente humana, ligada à sintaxe recursiva - a capacidade de construir frases complexas com estruturas hierárquicas.

Outros, como Savage-Rumbaugh, sugerem que os primatas podem estar mais próximos dessa habilidade do que se imagina, mas que os métodos de ensino ou as limitações dos experimentos podem não ter permitido a expressão plena desse potencial.

Além disso, os estudos com Washoe, Koko e Kanzi também levantaram questões éticas. Críticos apontaram que manter primatas em cativeiro para experimentos, mesmo que bem-intencionados, levanta dilemas sobre o bem-estar animal.

Por outro lado, defensores argumentam que esses estudos não apenas ampliaram o conhecimento sobre a cognição animal, mas também reforçaram a necessidade de proteger essas espécies ameaçadas, destacando sua proximidade com os humanos.

Os avanços na pesquisa com primatas continuam a inspirar novas abordagens, incluindo o uso de tecnologias modernas, como interfaces cérebro-computador, para explorar a comunicação animal.

Esses estudos reforçam a ideia de que, embora os grandes primatas compartilhem muitas capacidades cognitivas com os humanos, a linguagem humana permanece uma fronteira única, marcada pela curiosidade insaciável expressa em perguntas que moldam nossa compreensão do mundo.


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