Sir
Cosmo Duff Gordon: A Vida, o Titanic e a Polêmica
Sir
Cosmo Edmund Duff Gordon, 5º Baronete de Halkin (22 de julho de 1862 - 20 de
abril de 1931), foi uma figura proeminente da aristocracia britânica, conhecido
não apenas por sua herança como proprietário de terras, mas também por sua
carreira como esgrimista olímpico e por sua controversa participação na
tragédia do RMS Titanic em 1912.
Ao lado
de sua esposa, a renomada estilista Lucy Christiana Duff Gordon, conhecida
profissionalmente como "Lucile", ele viveu uma vida marcada por
privilégios, conquistas e um escândalo que manchou sua reputação para sempre.
Juventude
e Carreira
Nascido
em Londres, Cosmo era filho do honorável Cosmo Lewis Duff Gordon e Anna Maria
Antrobus. Educado no prestigiado Eton College, destacou-se desde jovem no
esporte, particularmente na esgrima, uma paixão que o levaria a conquistas
notáveis.
Em
1896, herdou o título de 5º Baronete de Halkin, uma honraria concedida a seu
tio-avô em 1813, em reconhecimento por sua bravura durante a Guerra Peninsular.
Esse título trouxe consigo vastas propriedades e responsabilidades,
consolidando sua posição na elite britânica.
Em
1900, Cosmo casou-se com Lucy Christiana Wallace, filha de Douglas Sutherland.
Lucy, sob o pseudônimo "Lucile", era uma estilista de alta-costura de
renome internacional, fundadora de uma maison que revolucionou a moda com
designs inovadores e elegantes.
Cosmo,
além de apoiar os empreendimentos de sua esposa, também se envolveu nos
negócios da empresa, demonstrando um interesse ativo no mundo da moda.
Como
esgrimista, Cosmo alcançou o auge de sua carreira esportiva nos Jogos Olímpicos
Intercalados de 1906, em Atenas, onde integrou a equipe britânica que
conquistou a medalha de prata.
Dois
anos depois, em 1908, participou do comitê de esgrima dos Jogos Olímpicos de
Verão, realizados em Londres, reforçando sua reputação como um atleta
respeitado.
A
Viagem no Titanic
Em
abril de 1912, Sir Cosmo e Lady Duff Gordon embarcaram na viagem inaugural do
RMS Titanic, o maior e mais luxuoso transatlântico da época, em Cherburgo,
França. Acompanhados pela secretária de Lucy, Laura Mabel Francatelli, ocuparam
camarotes de primeira classe (A-16 para Cosmo e A-20 para Lucy), com passagens
que custaram £39 12s - equivalente a cerca de £3.668 ou €4.450 em valores
atuais.
A
viagem prometia ser um marco de opulência e modernidade, mas terminaria em uma
das maiores tragédias marítimas da história. Na noite de 14 de abril de 1912, o
Titanic colidiu com um iceberg no Atlântico Norte.
Cosmo,
que dormia em seu camarote, foi acordado por Lucy, que sentiu o impacto da
colisão. Seguindo as ordens do capitão Edward J. Smith, o casal e a secretária
dirigiram-se ao convés, onde o caos começava a se instalar.
Sob a
supervisão do Primeiro Oficial William McMaster Murdoch, o bote salva-vidas
número 1 foi preparado para lançamento. Cosmo perguntou a Murdoch se ele, sua
esposa e a secretária poderiam embarcar, ao que o oficial consentiu.
Às
1h10, o bote foi baixado ao mar com apenas 12 ocupantes - sete tripulantes e
cinco passageiros, incluindo os Duff Gordons -, apesar de sua capacidade para
40 pessoas.
A
Polêmica do Bote Salva-Vidas
O que
aconteceu a bordo do bote número 1 tornou-se o epicentro de uma controvérsia
que perseguiu Cosmo pelo resto da vida. Após o Titanic afundar, deixando
milhares de pessoas nas águas geladas do Atlântico, o fogueiro Charles
Hendrickson sugeriu retornar ao local do naufrágio para resgatar sobreviventes.
Lady
Duff Gordon, temendo que o bote pudesse ser inundado por náufragos
desesperados, opôs-se à ideia, e Cosmo apoiou sua decisão. Os outros ocupantes,
incluindo os tripulantes, concordaram que voltar seria arriscado.
Assim,
o bote remou em direção a uma luz distante, que mais tarde se revelou ser o RMS
Carpathia, o navio que resgatou os sobreviventes do Titanic. Enquanto remavam,
o fogueiro Robert Pusey lamentou a perda de seus pertences e o fato de que a
White Star Line, proprietária do Titanic, não pagaria seu salário após o
naufrágio.
Em um
gesto que seria amplamente mal interpretado, Cosmo prometeu a cada tripulante
£5 (cerca de £460 ou €560 em valores atuais) assim que chegassem ao Carpathia.
Ele
cumpriu a promessa, entregando o dinheiro aos homens, mas o ato foi visto pela
imprensa e pela opinião pública como uma tentativa de suborno para garantir sua
própria segurança ou para evitar que o bote retornasse ao local do naufrágio.
Repercussões
e Inquérito
A
história do bote número 1 rapidamente ganhou as manchetes. Jornais da época,
especialmente nos Estados Unidos e no Reino Unido, retrataram Cosmo como um
aristocrata covarde que usou sua riqueza e influência para escapar do Titanic
enquanto mulheres e crianças pereciam.
A
imprensa sensacionalista sugeriu que ele havia subornado os tripulantes para
garantir um lugar no bote e evitar resgates, uma acusação que alimentou a
indignação pública.
Em
resposta às acusações, Cosmo e Lucy foram chamados a testemunhar na Comissão
Britânica de Inquérito sobre o Naufrágio do Titanic, presidida pelo Visconde
Mersey. Durante o inquérito, Cosmo defendeu-se vigorosamente, afirmando que não
havia dado ordens para que o bote não retornasse e que a oferta de £5 foi um
gesto de compaixão pelos tripulantes que haviam perdido tudo.
A
comissão concluiu que não havia evidências de suborno ou conduta criminosa, mas
a absolvição legal não foi suficiente para restaurar a reputação dos Duff
Gordons.
A
sociedade da época, movida por valores de cavalheirismo e sacrifício, via com
desconfiança o fato de um homem de sua posição ter sobrevivido em um bote com
tanto espaço vazio.
Contexto
Histórico e Social
A
polêmica envolvendo Sir Cosmo reflete o contexto social da época. No início do
século XX, a sociedade britânica valorizava ideais de honra e dever,
especialmente entre a aristocracia.
O lema
"mulheres e crianças primeiro", embora não fosse uma regra formal,
era amplamente esperado, e homens que sobreviveram ao Titanic frequentemente
enfrentaram escrutínio.
A
imprensa, alimentada pelo frenesi público, amplificou histórias que reforçavam
estereótipos de classe, retratando Cosmo como um símbolo de privilégio egoísta.
Além
disso, a tragédia do Titanic expôs falhas sistêmicas na segurança marítima,
como a insuficiência de botes salva-vidas e a falta de treinamento adequado
para a tripulação.
O bote
número 1, conhecido como o "bote dos milionários" devido aos seus
poucos e abastados ocupantes, tornou-se um símbolo dessas desigualdades,
intensificando as críticas aos Duff Gordons.
Vida
Após o Titanic
Após o
naufrágio, Cosmo e Lucy tentaram retomar suas vidas, mas o estigma da tragédia
os perseguiu. Lucy continuou a liderar sua maison de moda, que permaneceu
bem-sucedida, mas o casal enfrentou um declínio em sua posição social.
Cosmo,
em particular, retirou-se gradualmente da vida pública, afetado pela
controvérsia. Ele faleceu em 20 de abril de 1931, de causas naturais, em
Londres, aos 68 anos.
Foi
sepultado no Brookwood Cemetery, em Surrey, deixando um legado complexo,
marcado por suas conquistas esportivas e empresariais, mas ofuscado pela
tragédia do Titanic.
Legado
Sir
Cosmo Duff Gordon permanece uma figura controversa. Para alguns, ele foi um
homem injustamente vilipendiado, vítima de uma imprensa sensacionalista e de
expectativas sociais rígidas.
Para
outros, sua decisão de não retornar ao local do naufrágio e a oferta de
dinheiro aos tripulantes simbolizam uma falha moral em um momento de crise.
A
história do bote número 1 continua a ser debatida por historiadores e
entusiastas do Titanic, servindo como um lembrete das complexidades humanas
diante de uma tragédia sem precedentes.