Antônio Vicente Mendes
Maciel, conhecido como Antônio Conselheiro, nasceu em Nova Vila de Campo Maior
localizada na cidade de Quixeramobim no Estado do Ceará no dia 13 de março de
1830. Ele se autodenominava "o peregrino", foi um líder religioso.
Figura carismática,
adquiriu uma dimensão messiânica ao liderar o arraial de Canudos, um
pequeno vilarejo no sertão da Bahia, que atraiu milhares de sertanejos, entre
camponeses, índios e escravos recém libertos, e que foi destruído pelo Exército
da República na chamada Guerra de Canudos em 1896.
A imprensa dos primeiros
anos da República e muitos historiadores, para justificar o genocídio retrataram-no
como um louco, fanático religioso e contrarrevolucionário
monarquista perigoso. No dia 14 de maio de 2019, a Lei 13 829/19 incluiu
Antônio Conselheiro no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria.
Infância e vida no Ceará
Antônio
Vicente Mendes Maciel nasceu na cidade de Quixeramobim, então um pequeno
povoado perdido em meio à caatinga do sertão central da paupérrima província
do Ceará Grande.
Desde o
início da vida, seus pais queriam que Antônio seguisse a carreira
sacerdotal, pois entrar para o clero era naquela época uma das poucas
possibilidades que os pobres tinham para ascender socialmente.
Com a
morte de sua mãe, em 1834, a meta de transformar Antônio Vicente em padre tem
seu fim. Seu pai casa-se novamente, e existem registros de que a madrasta
espancava e maltratava o menino severamente.
Em 1855
morre o pai de Antônio, e aos 25 anos de idade ele é obrigado a abandonar os
estudos e assumir o comércio da família. Fracassam de vez quaisquer sonhos
sacerdotais.
Os
negócios não vão nada bem, e mais tarde Antônio será processado devido a não
quitação de suas dívidas. Em 1857 Antônio casa-se com Brasilina Laurentina de Lima,
jovem filha de um tio seu.
No ano
seguinte, o jovem casal muda-se para Sobral, onde Antônio Vicente passa a viver
como professor do primário, dando aulas para os filhos dos comerciantes e
fazendeiros da região, e mais tarde como advogado prático, defendendo clientes
em troca de pequena remuneração.
Passa a
mudar-se constantemente, em busca de melhores mercados para seus ofícios;
primeiro vai para Campo Grande (atual Guaraciaba do Norte) depois para Santa Quitéria e finalmente Ipu, então um pequeno
povoado localizado na divisa entre os sertões pecuaristas e a fértil Serra da
Ibiapaba.
Em 1861
ele flagra a sua mulher em traição conjugal com um sargento da polícia, em sua
residência na Vila do Ipu Grande. Envergonhado, humilhado e abatido, abandona o
Ipu e vai procurar abrigo nos sertões do Cariri, já naquela época um polo de
atração para penitentes e flagelados, iniciando aí uma vida
Peregrinações
Em Sergipe, em 1874, o
jornal O Rabudo traz a primeira menção pública de Antônio Maciel como penitente
conhecido nos sertões:
Há seis meses que por todo
o centro desta Província e da Província da Bahia, chegado (diz ele) do Ceará,
infesta um aventureiro santarrão que se apelida por Antônio dos Mares. O que, a
vista dos aparentes e mentirosos milagres que dizem ter ele feito, tem dado
lugar a que o povo o trate por S. Antônio dos Mares. Esse misterioso
personagem, trajando uma enorme camisa azul que lhe serve de hábito a
forma de sacerdote, pessimamente suja, cabelos mui espessos e
sebosos entre os quais se vê claramente uma espantosa multidão de bichos (piolhos).
Distingue-se pelo ar misterioso, olhos baços, tez desbotada e de pés nus; o que
tudo concorre para o tornar a figura mais degradante do mundo.
Já famoso como "homem
santo" e peregrino, Antônio Conselheiro é preso em 1876 nos sertões da
Bahia, pois corre o boato de que ele teria matado mãe e esposa.
É levado para o Ceará, onde
se conclui que não há nenhum indício contra a sua pessoa: sua mãe havia morrido
quando ele tinha seis anos. Antônio Conselheiro é posto em liberdade e retorna
à Bahia.
Em 1877, o Nordeste do
Brasil passa pela Grande Seca, uma das mais calamitosas secas de sua
história; levas de flagelados perambulam famintos pelas estradas em busca de
socorro governamental ou de ajuda divina; bandos armados de criminosos e
flagelados promovem justiça Social "com as próprias mãos"
assaltando fazendas e pequenos lugarejos, pois pela ética dos desesperados
"roubar para matar a fome não é crime".
Cresce a notoriedade da
figura de Antônio Conselheiro entre os sertanejos pobres; para eles, Antônio
Conselheiro, ou o "Bom Jesus", como também passa a ser chamado, seria
uma figura santa, um profeta enviado por “Deus” para socorrê-los.
Com o fim da escravidão, em
1888, muitos ex-escravos, libertos e expulsos das fazendas onde trabalhavam sem
ter então nenhum meio de subsistência, partem em busca de Conselheiro.
Arraial de Canudos
Em 1893, cansado de tanto
peregrinar pelos sertões e então sendo um "fora da lei", Conselheiro
decide se fixar à margem Norte do Rio Vaza-Barris, num pequeno arraial chamado
Canudos.
Nasce ali uma experiência
extraordinária: em Belo Monte (como a rebatizou Antônio Conselheiro, apesar de
encontrar-se em um vale cercado de colinas), os desabrigados do sertão e as
vítimas da seca eram recebidos de braços abertos pelo peregrino, era uma
comunidade onde todos tinham acesso à terra e ao trabalho sem sofrer as agruras
dos capatazes das fazendas tradicionais.
Um "lugar santo",
segundo os seus adeptos. Durante o período em que liderou o povoado de
"Belo Monte", escreveu os "Apontamentos dos Preceitos da Divina
Lei de Nosso Senhor Jesus Cristo, para a Salvação dos Homens", que
consiste de uma coletânea de reflexões sobre temas diversos, de matiz
fundamentalmente religioso.
O lugar atraiu milhares de
agricultores pobres, índios e escravos recém-libertos, que começaram a
construir uma comunidade igualitária inspirada no exemplo da doutrina
Católica.
Por meio do trabalho
comunitário, conseguiu-se que ninguém passasse fome. Tratava-se de uma
comunidade rural, com uma economia autossustentável, baseada na solidariedade.
A religião era um instrumento da libertação social.
Guerra de Canudos
Em 1896 ocorre o episódio
que desencadeia a Guerra de Canudos: em 24 de novembro desse ano, é enviada a
primeira expedição militar contra Canudos, sob comando do Tenente Pires
Ferreira. Mas a tropa é surpreendida pelos fiéis de Antônio Conselheiro,
durante a madrugada, em Uauá.
Após um combate corpo a
corpo são contados mais de cento e cinquenta cadáveres de conselheiristas.
Do lado do exército morreram oito militares e dois guias.
Estas perdas, embora
consideradas "insignificantes quanto ao número" nas palavras do
comandante, ocasionaram o retiro das tropas. Em 29 de dezembro de 1896 tem
início uma segunda expedição militar contra Canudos.
Assim como a primeira, está
expedição foi violentamente debelada (vencida) pelos conselheiristas. No ano
seguinte tem início a terceira expedição contra Canudos; comandada pelo coronel
Antônio Moreira Cesar, conhecido como "o Corta-Cabeças", por suas
façanhas na Revolução Federalista, no Rio Grande do Sula.
Mas, acostumado aos
combates tradicionais, Moreira César não estava preparado para eliminar
Canudos, e foi abatido por tiros certeiros de homens leais a Antônio
Conselheiro.
A tropa foge em debandada,
deixando para trás armamentos e munição. Para os conselheiristas, trata-se de
uma prova cabal da santidade do beato de Belo Monte.
Em 5 de abril de 1897 tem
início a quarta e última expedição contra Canudos; desta vez o cerco foi
implacável; até muitos dos que se rendiam foram mortos; eliminar Canudos e seus
habitantes tornou-se uma questão de honra para o exército.
Morte
Em 22 de setembro de 1897,
morre Antônio Conselheiro. Não se sabe ao certo qual foi a causa de sua morte.
As razões mais citadas são ferimentos causados por uma granada, e uma forte
disenteria. Em 5 de outubro de 1897 são mortos os últimos defensores de
Canudos, e o exército inicia a contagem das casas do arraial.
No dia seguinte o cadáver
de Antônio Conselheiro é encontrado enterrado no Santuário de Canudos, sua
cabeça é cortada e levada até a Faculdade de Medicina de Salvador para ser
examinada pelo Dr. Nina Rodrigues, pois para a ciência da época, "a
loucura, a demência e o fanatismo" deveriam estar estampados nos traços de
seu rosto e crânio. O arraial de Canudos é completamente destruído.
Em 3 de março de 1905, um
incêndio na antiga Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus, em Salvador
(BA), destrói a cabeça de Antônio Conselheiro, que lá se encontrava desde o
final da guerra de Canudos, em outubro de 1897.
Suposta Loucura
O diagnóstico de louco,
mais especificamente de portador de uma Psicose sistemática progressiva
(termo equivalente ao delírio crônico proposto por Magnan) e a
paranoia dos italianos, (referindo-se à Eugênio Tanzi e Gaetano Riva)
por uma célebre autoridade sanitária da época, o Dr. Nina Rodrigues (1862
- 1906), no qual se fundamentaram os escritos da época (inclusive de Euclides
da Cunha), ainda hoje se constitui como um entrave para o reconhecimento de seu
mérito como líder comunitário responsável pela organização de mais de 24 mil
pessoas em um ambiente extremamente adverso (Martins) e até mesmo como um homem
religioso com verdadeiros ideais cristãos.
A pecha de loucura e
fanatismo religioso com os conceitos da época de psicologia
social inspiradas na obra de Gustave Le Bon (1841—1931) também são
responsáveis por toda uma lógica de interpretação das revoltas sociais como
ocasionadas por influência de uma personalidade psicopática, a insanidade moral
proposta por henry Maudsley (1835–1918), num ambiente de ignorância,
pobreza ou degenerescência tal como se designava na época, incluindo entre
esses fatores psicossociais características biológico raciais. (ver Rodrigues).
Memorial
Há dois centros
culturais relacionados a Antônio Conselheiro e à Guerra de Canudos. Um
localizado em Quixeramobim no interior do Ceará, conta a história de seu
filho ilustre, e está situado no centro da cidade.
O imóvel, tombado pelo
Ministério da Cultura em 2006, foi a casa em que Antônio Conselheiro nasceu e
viveu até os seus 27 anos de idade. Após o tombamento, foi criado no local
a Casa de Cultura e Memorial do Sertão Cearense.
O outro centro cultural
está situado em canudos, Bahia, criado pelo Decreto 33 333, de 30 de junho de
1986, (publicado no Diário Oficial de 1º de julho) mantido e administrado em
parceria com a UNEB.
Lenda
Com o passar do tempo, a
casa de Antônio Conselheiro em Quixeramobim foi se tornando palco de contos de
assombração. Acredita-se na cultura popular, que a casa abriga espíritos e que
existem tesouros enterrados em vasos de barro. Essas histórias passaram a fazer
parte do folclore local.